Usando o argumento da existência de discussões
travadas a respeito da aplicação do IDPJ (Incidente de Desconsideração da
Personalidade Jurídica) aos executivos fiscais, a PGFN editou a portaria n. 948
em setembro de 2017, estabelecendo o “Procedimento Administrativo de
Reconhecimento de Responsabilidade” (PARR).

A aludida Portaria tem como objetivo principal, a
responsabilização de terceiros pelo encerramento irregular de pessoas jurídicas
ao pagamento dos tributos da empresa, fazendo com que estes figurem como
corresponsáveis pelos débitos.

Através da Portaria PGFN n. 948 de 25 de setembro de
2017, o terceiro é notificado por carta com aviso de recebimento e pode
apresentar impugnação administrativa se entender necessário, através da
plataforma de atendimento virtual da PGFN, Regularize.

A Portaria PGFN n. 948 de 25 de setembro de 2017,
destina-se a única e exclusivamente a apurar a responsabilidade de terceiro
pela dissolução irregular da empresa originariamente
devedora, conforme
preceitua o art. 1º:

Art.
1º Esta Portaria regulamenta o procedimento administrativo para apuração de
responsabilidade de terceiros pela prática da infração à lei consistente
na dissolução irregular de pessoa jurídica devedora de créditos inscritos em
dívida ativa administrados pela PGFN.

Outrossim, apesar de prever a possibilidade de
apresentar impugnação administrativa, o procedimento fere o princípio do
devido processo legal, contraditório e ampla defesa
, pois a defesa é
julgada pelo próprio Procurador da Fazenda Nacional em exercício na unidade
descentralizada responsável pela inscrição em dívida ativa.

É evidente que o próprio credor não será imparcial
ao julgar a impugnação do contribuinte, dado o interesse arrecadatório em jogo.

Outro
ponto que também evidencia o desrespeito ao devido
processo legal, contraditório e ampla defesa, é que a citada Portaria prevê que o terceiro, cuja a
responsabilidade se busca alcançar, não
pode impugnar o lançamento do crédito tributário, mas tão somente a apuração da
sua responsabilidade pessoal
, conforme está disposto no art. 4º, §2º:

“Art. 4º.
A impugnação deverá ser apresentada exclusivamente por meio do e-CAC da PGFN e
deverá trazer elementos aptos para demonstrar a inocorrência de dissolução
irregular ou a ausência de responsabilidade pelas dívidas.

(…)

§ 2º A
impugnação deverá se limitar à discussão objeto do PARR.”

Ou
seja, se o débito estiver extinto pelo pagamento ou prescrição, ou se estiver
com a exigibilidade suspensa por decisão judicial ou parcelamento, situações
que impedem sua cobrança, nada disso poderá ser alegado para impedir sua
responsabilização, desrespeitando
claramente à garantia constitucional de ampla defesa e contraditório.

De igual modo, a inconstitucionalidade da referida
Portaria é evidente desde o seu 1º artigo, ao indicar que a responsabilidade
tributária do terceiro recairá sobre créditos inscritos em dívida ativa
administrados pela PGFN.

Ocorre
que não é dado à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional o poder de alterar o
devedor do débito inscrito, encontrando
óbice não só no artigo 142 do Código Tributário Nacional, como também na jurisprudência
do Superior Tribunal de Justiça, conforme preceitua a súmula n. 392,
os
quais dispõem respectivamente:

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

A inconstitucionalidade da portaria PGFN , que estabelece o PARR

 Parágrafo
único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob
pena de responsabilidade funcional.

Súmula
392

A Fazenda
Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da
sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal,
vedada a modificação do sujeito passivo da execução.

Ao
investigar de forma administrativa a eventual dissolução irregular da pessoa
jurídica cuja originariamente responsável, a fim de responsabilizar
administrativamente terceiros por débitos definitivamente constituídos, a
Procuradoria Geral da Fazenda Nacional age
de forma ilegal, uma vez que lhe é vedada a modificação de determinados
elementos do lançamento tributário, como apuração do quantum devido,
determinação da matéria tributável, identificação do sujeito passivo,
nos
termos do art. 142 do CTN e súmula 392 do STJ.

Além
do mais, a responsabilização de terceiros por débitos tributários de pessoa
jurídica da qual façam parte, tem previsão no art. 135, III, do CTN,
condicionando a incidência do referido artigo a existência dos requisitos: atos
praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos.

Outrossim,
a súmula 435 do STJ dispõe que: “Presume-se
dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio
sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da
execução fiscal para o sócio-gerente”

Também
não há que se falar em redirecionamento
da cobrança aos sócios por dissolução irregular através de procedimento
administrativo, uma vez que este procedimento só é legitimado através da
execução fiscal, conforme preceitua a súmula 435 do STJ.

Não
bastasse tudo isso, é certo que a utilização desse procedimento prejudica até a defesa do terceiro que se
busca responsabilizar
, pois uma vez que seu nome passe a constar na
certidão de dívida ativa, presume-se que a sua responsabilização tributária
está caracterizada e é legítima, recaindo
sobre o contribuinte o ônus da prova de que não houve prática de infração à
lei.

Hoje,
este ônus recai sobre a Fazenda quando do requerimento do redirecionamento da
execução fiscal.

Por fim, deve-se mencionar que o procedimento em questão fere o princípio da segurança jurídica, pois ainda não há um consenso jurisprudencial sobre qual sócio deve responder pelas dívidas da empresa encerrada ou mesmo qual o termo a quo do prazo prescricional para responsabilização do sócio, questões que são objeto dos Temas n. 444, 962 e 981 na sistemática dos Recursos Repetitivos.

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Por: Dra. Tamires De Morais Reis

OAB/SP 374.845

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Fonte: Jornal Contábil
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