A questão de ressarcimento de sócios minoritários prejudicados

Um fato importante aconteceu em maio deste ano. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo condenou a Novonor, antiga Odebrecht, a pagar uma indenização de mais de R$ 8 bilhões à Braskem. Noticiada sem muito alarde, a decisão favoreceu uma ação por abuso de poder de controle movida em 2018 por dois acionistas minoritários. É aí que está a relevância da informação. No Brasil, o mais comum é que os sócios minoritários sempre saiam prejudicados por iniciativas unilaterais dos acionistas controladores.

E não há muitas ferramentas para se fazer justiça. O artigo 246 da Lei das S.A. é visto como o único instrumento dos minoritários para exigir que o controlador faça o ressarcimento de prejuízos que causou à empresa controlada. Se a companhia perdeu dinheiro significa que seus acionistas também perderam. Então, conseguir uma indenização com base em decisões judiciais é uma maneira de os acionistas menores recuperarem, pelo menos em parte, a rentabilidade financeira que é de direito e que só não aconteceu por causa de “perdas artificiais” geradas por quem estava no comando.

Cabe recurso e, certamente, a Novonor vai recorrer. De qualquer forma, a notícia é boa, não apenas para os minoritários e para a Braskem como também para a “governança corporativa” como um todo. É verdade que uma boa governança não permitiria que as coisas chegassem aonde chegou. O certo era o modelo de gestão inviabilizar que os majoritários tomassem decisões ruins ou pelo menos possibilitasse a correção sem necessidade de acionamento da Justiça.

Mas boas leis, capazes de regular o mercado e colocar todos em condições de igualdade, é parte importante da governança das empresas, mesmo sendo uma regra externa. Ao falhar tudo, ainda existe um canal não controlado pelos mais poderosos dentro da corporação que os minoritários podem acionar para restabelecer a ordem na companhia. No entanto, isso nos faz refletir que faltam regras mais transparentes e precisas para tornar as relações entre sócios mais justas.

Como já foi dito, o artigo 246 é praticamente o único instrumento a favor do sócio menor. E este não é o único “senão” a ser observado. Além de um regramento insuficiente, nossa justiça costuma ser lenta. E o sistema de arbitragem, criado para ser mais ágil, não é tão acessível. É caro e com determinadas normas que beneficiam descaradamente quem tem mais poder. Os acionistas minoritários que entraram com ação contra a varejista Americanas sabem muito bem do que estou falando.

A questão aqui é cultural. Nos Estados Unidos, quando um acionista minoritário é prejudicado pelo majoritário, a justiça de lá determina que a indenização (compensação) seja paga diretamente ao sócio menor. Aqui, não ressarcir a parte mais fraca, seja a controlada em si ou os acionistas pessoas físicas, parece até uma questão de honra para os majoritários. E as leis são criadas com este viés. Vamos tomar como exemplo a Petrobras. Na época da operação Lava Jato, a polícia federal descobriu muitos desvios, corrupção que prejudicou acionistas no Brasil e nos Estados Unidos.

Pois bem, a Petrobras teve de pagar uma multa tanto lá como cá. A diferença é que lá o dinheiro da multa foi distribuído entre os investidores lesados. E aqui, queriam criar um fundo contra a corrupção. Mas e os investidores? Não mereciam ser ressarcidos também? Trata-se aqui apenas de um exemplo. Não é só com acionistas que isso acontece. É comum também ser noticiado que a Justiça do Trabalho desbaratou algum esquema de trabalho escravo, obrigando o mau empresário a registrar e acertar os direitos dos trabalhadores lesados e a pagar uma multa para o órgão fiscalizador. Ora, não seria justo que essa multa, pelo menos em parte, fosse entregue às pessoas que tiveram a dignidade violada? Afinal, registrar e pagar direitos trabalhistas é o básico. O castigo de verdade seria o patrão escravagista vendo suas vítimas receberem mais do que ele queria pagar.

A boa governança impede que injustiças sejam cometidas, seja contra um investidor, um acionista menor, seja contra um colaborador. Mas como se vê, o modelo de gestão empregado internamente pelas corporações nem sempre previne problemas deste tipo. Aliás, em muitos casos quem deveria zelar pelo bom funcionamento dos processos é justamente quem busca falhas para poder levar vantagem. Precisamos de uma legislação mais abrangente, que dê mais força a quem não tem como brigar pelos próprios direitos. Mas como vemos, vamos precisar de uma mudança cultural na sociedade como um todo para que isso se torne realidade.

Artigo escrito por  Roberto Gonzalez é consultor de governança corporativa e ESG e conselheiro independente de empresas. É autor do livro “Governança Corporativa – O Poder de Transformação das Empresas” 

por Compliane Comunicação

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Fonte: PORTAL CONTNEWS
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