A POSSE TEM VALOR E IMPORTÂNCIA ECONÔMICA, podendo inclusive serem partilhados direitos de posse sobre imóvel não escriturado e não registrado (STJ, REsp 1984847/MG, j. em 21/06/2022). Em que pese ser antiga e desde os bancos acadêmicos a longa discussão sobre a natureza jurídica da posse, abraçamos a conclusão do Civilista, Advogado e Ex-Desembargador, Dr. CARLOS ROBERTO GONÇALVES (Direito Civil Brasileiro. 2021) que por sua vez alinha-se com a opinião do não menos ilustre Clóvis Beviláqua para quem a posse não é um direito real, mas sim um “DIREITO ESPECIAL” – ou ainda, uma figura especialíssima e, dessa forma, SUI GENERIS.
Fato é que a POSSE qualificada vai permitir a aquisição mobiliária e imobiliária através da USUCAPIÃO como reconhece o Código Civil em diversas modalidades, assim como nos assentos 183 e 191 da Carta Maior:
“Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”.
“Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade”.
A posse se obtém originariamente (já que é possível tomar posse sem que alguém lhe “transfira” a posse) ou de forma derivada (quando então ocorre a transmissão onerosa ou graciosa da posse), podendo ser transmitida inclusive “causa mortis”, como indubitavelmente decreta o art. 1.784 do CCB cristalizando o DIREITO DE SAISINE. Como já falamos outrora a SOMA DAS POSSE é plenamente reconhecida pelo ordenamento jurídico, razão pela qual não se pode mesmo negar a possibilidade da transmissão/negociação da mesma. Os artigos 1.243 e 1.207 do Código Reale também não deixam dúvidas:
“Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de CONTAR O TEMPO EXIGIDO pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores (art. 1.207), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e de boa-fé”.”Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado UNIR SUA POSSE à do antecessor, para os efeitos legais”.
Em perfeita sintonia com as regras destacadas encontram-se, por exemplo, as regras do CÓDIGO DE NORMAS DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA – PARTE EXTRAJUDICIAL do RIO DE JANEIRO que autorizam a lavratura, tanto da Escritura Declaratória de Posse (modo originário, por assim dizer) quanto da Escritura de Cessão de Direitos de Posse (derivação ou transmissão, por assim dizer):
“Art. 220. Nas Escrituras Públicas Declaratórias de Posse e de Cessão de Direitos de Posse, deverá constar, obrigatoriamente, declaração de que a mesma não tem valor como confirmação ou estabelecimento de propriedade, servindo, tão-somente, para a instrução de ação possessória própria”.
Como vemos, portanto, o instrumento pode ser perfeitamente lavrado não havendo espaço para RECUSAS INFUNDADAS por parte dos Tabelionatos (o que muito acontece e precisa ser repreendido) já que o instrumento corretamente instruído e lavrado tem sua utilização na Ação Possessória própria e inclusive na USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL que é manejada diretamente nos Cartórios Extrajudiciais (não se confundindo com a ATA NOTARIAL) com assistência obrigatória de ADVOGADO, conforme art. 216-A da LRP e Provimento CNJ 65/2017.
Mesmo sabendo que a transação envolvendo posse pode também ser feita por Instrumento Particular nossa recomendação será sempre pela sua formalização pelo Instrumento Público dados os seus caracteres importantes e valiosos que, mesmo nesse cenário de recusa infundada e injusta, precisa ser PRESTIGIADO – já que a parcela confusa e retrocessa destes operadores não representa mesmo a classe extrajudicial antenada.
POR FIM, de se destacar por importante que apenas o Instrumento (público ou particular) da cessão da posse isoladamente pode não servir para o intento das partes: é necessário robustecer o conjunto probatório para qualificar a posse a alicerçar o caminho para aquisição da propriedade e assento no RGI através da ação adequada, como reconhece com acerto a jurisprudência do TJPR:
“TJPR. 1508875-0 (Acórdão). J. em: 07/12/2016. AÇÃO DE USUCAPIÃO. ACESSIO POSSESSIONIS. ART. 1.243 DO CCB. EXERCÍCIO DE POSSE NO IMÓVEL PELOS AUTORES E SEUS ANTECESSORES. NÃO COMPROVAÇÃO. PROVA DOCUMENTAL. INDÍCIOS FRACOS. CONTRATOS PARTICULARES OU ESCRITURAS PÚBLICAS DE CESSÃO DE POSSE QUE, EM QUE PESE COMPROVEM A REALIZAÇÃO DE TAIS NEGÓCIOS JURÍDICOS, APENAS INDICIAM O EXERCÍCIO DA POSSE, DEVENDO TAIS INDÍCIOS SER CORROBORADOS PELAS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS.PRECEDENTES. COMPROVANTES DE PAGAMENTO DE IPTU. AUSÊNCIA DE EXERCÍCIO DE FATO DOS PODERES DA SITUAÇÃO JURÍDICA PROPRIETÁRIA. ART. 1.196 DO CCB. FOTOS DO ESTADO ATUAL DO IMÓVEL. VEGETAÇÃO E TERRENO COM ACESSO ABERTO PARA A RUA. PROVA TESTEMUNHAL ABSOLUTAMENTE GENÉRICA E LACUNOSA. NÃO CORROBOROU OS INDÍCIOS DOCUMENTAIS. APELAÇÃO DESPROVIDA. Em que pese os contratos particulares ou por escritura pública de cessão da posse comprovem a realização do negócio jurídico de transmissão da posse, não são aptos, por si, a comprovar o efetivo exercício da posse pelos cessionários nos períodos compreendidos entre a aquisição contratual da posse e sua transmissão, devendo ser corroborados pelas demais provas dos autos”.
Original de Julio Martins
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Fonte: Jornal Contábil
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