O SÓ FATO DO TEMPO, isolado e principalmente divorciado dos demais requisitos que a Lei exige para a consolidação da aquisição pela USUCAPIÃO, não tem o condão de conferir o direito ao imóvel assim ocupado. Não por outra razão sempre destacamos aqui que a aquisição da propriedade imobiliária acontece – independemente de qualquer processo judicial ou procedimento extrajudicial – bastanto a reunião dos requisitos exigidos por Lei – e que fique claro, nenhuma das modalidades reconhecidas pelo ordenamento exige APENAS o tempo do exercício da posse.
Comum à todas as espécies de Usucapião reconhecidas pelo ordenamento está a exigência de COISA HÁBIL, TEMPO e POSSE QUALIFICADA.
1. COISA HÁBIL – porque nem todas as coisas são suscetíveis à Usucapião; nem todas elas são usucapíveis – como o exemplo clássico dos BENS PÚBLICOS, como reserva desde já o par. 3º do art. 183 da CRFB/88 com nenhuma dificuldade para a compreensão:
“3º. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião”.
Cabe anotar aqui a importância desse aspecto que tem sido a razão para a IMPOSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO de imóveis financiados da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, por exemplo, sendo assente o entendimento de que “por serem destinados especificamente à utilização em projetos habitacionais, são submetidos a regime de direito público, sendo por isso insuscetíveis de usucapião”. Como já dissemos muitas vezes cabe sempre uma análise cuidadosa nesses casos já que há sim casos onde mesmos tais imóveis podem ser alvo de USUCAPIÃO;
2. TEMPO – porque como requisito basilar também para a aquisição mediante Usucapião, esta só se completará se rigorosamente observar o tempo de ocupação exigido por Lei. Dentre as modalidades reconhecidas pelo ordenamento brasileiro tempos atualmente Usucapião possível em 2, 5, 10 e 15 anos. Cabe recordar que o Código Civil permite para fins de CONTAGEM DO PRAZO exigido a SOMA DAS POSSES, conforme regras dos arts. 1.207 e 1.243 do Código Reale;
3. POSSE QUALIFICADA – não é qualquer posse que conduz à aquisição por USUCAPIÃO. A posse precisa ser qualificada e revelar ÂNIMO DE DONO: não vale a posse exercida com tolerância ou permissão dos titulares registrais; não vale por exemplo a POSSE exercida por quem está no imóvel por causa de um CONTRATO DE LOCAÇÃO ou mesmo um COMODATO – ainda que verbais; se não há exercício da posse capaz de identificar nas atitudes do ocupante a nuance de DONO essa posse não pode frutificar USUCAPIÃO – todavia, não se desconhece um instituto não tão conhecido da graduação como a INTERVERSIO POSSESSIONIS – ou interversão da posse – que literalmente muda o caracter da posse, transmudando-a e passando a permitir que aquela posse possa levar à aquisição pela Usucapião. O Enunciado 237 do CJF esclarece:
“É cabível a modificação do título da posse – interversio possessionis – na hipótese em que o até então possuidor direto demonstrar ato exterior e inequívoco de oposição ao antigo possuidor indireto, tendo por efeito a caracterização do animus domini”.
POR FIM, é preciso não esquecer que a Lei, com todo acerto, descortina diversas ESPÉCIES DE USUCAPIÃO com seus respectivos requisitos, sendo muito prudente que o profissional que estiver diante de um caso concreto analise acuradamente as peculiaridades de cada caso, já que enquanto algumas exigem inclusive BOA-FÉ e JUSTO TÍTULO, outras simplesmente os dispensam, sendo IRRELEVANTE que a posse tenha sido, por exemplo, baseada em algum “documento” que tenha transmitido a posse ou mesmo que o pretendente conheça ou desconheça vícios da posse.
A jurisprudência paulista exemplifica a improcedência que se impõe em casos onde os requisitos da Usucapião não são cabalmente preenchidos e demonstrados:
“TJSP. 0010981-55.2013.8.26.0189. J. em: 28/05/2018. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. Autora pretende usucapir lote urbano sobre o qual alega exercer a posse há mais de 15 anos. Sentença de improcedência. Apelo da autora. USUCAPIÃO IMPROCEDENTE. Ausência dos requisitos. Prescrição aquisitiva. Modo originário de aquisição da propriedade. Requisitos legais. Coisa hábil (res habilis) ou suscetível de usucapião, posse (possessio) e decurso do tempo (tempus). Não preenchimento. Autora não detinha a posse com INTENÇÃO DE DONA, haja vista estar ali mediante SIMPLES TOLERÂNCIA do proprietário (seu tio). Mera tolerância ou permissão não gera posse, o que inviabiliza, consequentemente, a usucapião. Precariedade da posse. Não convalescimento. Sentença mantida. Recurso desprovido”.
Original de Julio Martins
Fonte: Jornal Contábil
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