INVENTÁRIO, USUCAPIÃO e ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA são algumas formas de regularizar imóveis que de uns anos para cá passaram a ser viáveis também pela via EXTRAJUDICIAL – sem processo judicial, direto em Cartório, com assistência de Advogado – desde que preenchidos os requisitos legais.
Ao profissional que pretende se enveredar pela interessante e desafiadora seara da regularização de imóveis pela via extrajudicial tão importante quanto conhecer cada uma das ferramentas em si é conhecer as regras do EXTRAJUDICIAL que podem ser muito diferentes do meio judicial, especialmente com os regramentos específicos de cada Estado (já que as Corregedorias locais possuem o Código de Normas que trarão regras específicas para o meio extrajudicial do Estado em questão) e também as normatizações egressas do CONSELHO NACIONAL DA JUSTIÇA e a própria legislação ordinária (vide, por exemplo, a Lei Federal 14.382/2022). Conhecer também o entendimento jurisprudencial acerca da matéria é muito importante, já que em determinado momento um precedente pode ser favorável, outrora outro precedente.
Como já falamos aqui, o exame da documentação atualizada do Cartório que exiba a ORIGEM REGISTRAL é primordial. Lado a lado com o relato completo do histórico do caso será possível ao profissional dimensionar o caso e identificar quais caminhos sejam possíveis para alcançar a tão sonhada regularização do imóvel em nome do pretendente, o assento registral em SEU NOME, com toda aura de segurança jurídica que só o Registro de Imóveis confere, na forma do art. 1º da Lei 8.935/94, com a chancela da CRFB/88, senão vejamos:
“Art. 1º. Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a GARANTIR a publicidade, autenticidade, SEGURANÇA e eficácia dos atos jurídicos”.
Alcançar o inscrição registral em seu nome relativa a seu imóvel é tudo que busca quem pretende regularizar seu imóvel, muitas vezes ocupado por anos mas sem ESCRITURA e sem REGISTRO; muitas vezes sequer um TÍTULO particular o ocupante possui, desconhecendo inclusive seu histórico registral.
O INVENTÁRIO é a solução que o direito apresenta para a solução dos bens deixados por pessoas falecidas. Inventário geralmente é tratado juntamente com a PARTILHA ou com ADJUDICAÇÃO. Inventariar significa arrolar, descrever. Partilhar dividir entre vários destinatários. Adjudicar dar para o único beneficiário; daí portanto quando se fala em Inventário e Partilha subentende-se que haverá discriminação do acervo deixado pelo DEFUNTO e divisão entre seus herdeiros; quando ser tratar de Inventário e Adjudicação além da discriminação do acervo deixado haverá a atribuição exclusiva e única para seu único beneficiário. Observados os requisitos da Lei 11.441/2007 (repetidos no Código Fux) poderá o Inventário ser resolvido na via extrajudicial com evidentes vantagens face ao Inventário Judicial (que permanece sendo possível através de processo ainda que as partes se enquadrem no requisito para a solução via cartório, haja vista a FACULTATIVIDADE do procedimento).
O procedimento de Inventário Extrajudicial tem regulamentação pelo CNJ através da Resolução 35/2007 que tem diversas modificações, sendo a última ocorrida em 2022 com a Resolução CNJ 452/2022. Como já tivemos oportunidade de dizer aqui, o Inventário é a medida para a regularização de bens deixados por pessoas já falecidas, sendo certo que a transmissão do morto para seus herdeiros não se dá como o Inventário como alguns imaginam, mas sim por força de Lei, na forma do art. 1.784 do CCB (Direito de Saisine). A partir daí, a regularização vem com o INVENTÁRIO (que envolve o pagamento de diversas custos – como taxa judiciária ou emolumentos cartorários, IMPOSTO CAUSA MORTIS, honorários advocatícios, obtenção de diversas certidões e além do enfrentamento de diversas questões peculiares aos complexos casos que tratam o DIREITO DAS SUCESSÕES. Não se olvide, como veremos adiante, que excepcionalmente imóveis objeto de HERANÇA em inventários poderão também ser regularizados via USUCAPIÃO, inclusive Extrajudicial.
A ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA é a solução que o direito oferece para os casos onde o promitente comprador cumpriu sua parte porém não obteve a tão conhecida “ESCRITURA DEFINITIVA”, injustamente, por diversos motivos, como aponta a jurisprudência. Esse termo (“Escritura Definitiva”) sugere a existência de um Contrato anterior (Promessa de Compra e Venda ou Cessão) que não se “converteu” no definitivo e efetivamente é o que a Lei mira: o cumprimento da vontade entabulada no Contrato anterior (Contrato Preliminar), desde que demonstrado pelo interessado/Promitente Comprador que ele cumpriu sua parte. Os arts. 1.417 e 1.418 do Código Civil não esgotam o assunto mas já tratam do direito que assiste ao Promissário Comprador, senão vejamos:
“Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.
Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel”.
Merece destaque que a ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA terá lugar ainda que o Contrato não esteja registrado em Cartório, a despeito de que esclarecem os artigos acima, como mostra com escorreito rigor e impecável acerto a decisão do Tribunal Mineiro:
“TJMG. 10106150012081001. J. em: 01/08/2019. APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA – CONTRATO DE COMPRA E VENDA – DESNECESSIDADE DE REGISTRO – INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 239 DO STJ – PAGAMENTO INTEGRAL DO PREÇO E RECUSA DO VENDEDOR NA OUTORGA DA ESCRITURA – COMPROVAÇÃO – PROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. Comprovada a celebração de contrato de compra e venda de imóvel, a quitação total do preço pelo comprador, bem como a recusa do vendedor em outorgar a escritura, a adjudicação compulsória é medida que se impõe. O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis. Inteligência da Súmula nº 239 do STJ”.
A Adjudicação Compulsória sempre foi tratada na via JUDICIAL através de Processo. Com a recente Lei 14.382/2022 tornou-se possível seu manejo pela via EXTRAJUDICIAL, direto no Cartório do RGI, com assistência de ADVOGADO. A solução com certeza virá mais rápido que na via tradicional (que continua sendo possível, haja vista a FACULTATIVIDADE do procedimento). A regulamentação pelo CNJ ainda não existe, pelo menos até a digitação deste breve ensaio, porém as regras do art. 216-B da Lei 6.015/73 (com modificações incluídas pela citada Lei 14.382/2002) já permitem vislumbrar a realização do procedimento. Custos aqui também são previsíveis como honorários Advocatícios, custos do Cartório e pagamento do ITBI, além de certidões e outros elementos, se adotada a via extrajudicial (Cartório do RTD, se for o caso, etc).
POR FIM, mas nem de longe pretendendo esgotar o importante e interessante assunto da regularização imobiliária, temos que a USUCAPIÃO é uma das mais abrangentes formas de regularização de imóveis, que inclusive pode abarcar imóveis que num primeiro momento cogitados à solução pela via do Inventário ou da Adjudicação Compulsória, como vistos acima.
Usucapião sempre foi um processo complexo e demorado manejado pela via judicial. Muito comum a notícia de processos judicial de Usucapião onde a solução é alcançada depois de anos de tramitação (dez a quinze anos, podendo ser muito mais inclusive). Na via EXTRAJUDICIAL a promessa é uma solução mais rápida mas não podemos ser ingênuos em acreditar que a solução chegará sempre em alguns meses (120 dias, como muitos propalam). O procedimento – que se inicia no TABELIONATO DE NOTAS e deve ser concluído no REGISTRO DE IMÓVEIS, com assistência obrigatória de ADVOGADO – envolve a necessidade de intimação de diversas partes envolvidas, especialmente ENTES PÚBLICOS. Claro que as soluções da Lei 13.465/2017 bem como do PROVIMENTO CNJ 65/2017 foram importantes para dar viabilidade ao procedimento porém ainda assim, com honestidade, não é um procedimento que se resolve em poucos “meses” – ainda assim muito mais vantajoso que na via judicial em muitos casos.
Da mesma forma como nos outros dois procedimentos extrajudicializados, também na Usucapião Extrajudicial fica facultado aos interessados adotarem a via judicial ainda que preenchidos os requisitos para a adoção da via administrativa em prestígio à FACULTATIVIDADE aqui também presente (art. 2º do Provimento CNJ 65/2017). Na usucapião, tanto na via judicial quanto na via extrajudicial não podemos perder de vista que se trata de uma forma de aquisição ORIGINÁRIA (e não derivada) razão pela qual não há necessidade de recolhimento de ITBI ou ITD (ITCMD) no procedimento – sendo necessário, por óbvio, o recolhimento dos emolumentos (ou taxa judiciária, se for o caso), além das demais despesas de praxe e honorários advocatícios.
Sobre o importante instituto, agora extrajudicializado, a pertinente e abalizada doutrina de NELSON ROSENVALD e CHRISTIANO CHAVES FARIAS (Curso de Direito Civil. 2018) ensina:
“Esse novo caminho para a aquisição originária da propriedade, desjudicializado e célere, evidencia a preocupação do ordenamento jurídico não apenas com a garantia do direito do proprietário de excluir os não proprietários do conteúdo mínimo do domínio, como, e mais importante, permitir que a enorme coletividade de não proprietários não seja excluída do acesso à titularidade (…) A verdade é que o direito deve se adequar às constantes transformações sociais. Romanticamente a usucapião ainda é pensada como forma de conversão do fato da posse natural em propriedade, quando a prática demonstra que grande parte dos candidatos a ela aspiram simplesmente por uma REGULARIZAÇÃO de titularidades que, por várias razões, não atendiam às formalidades registrais”.
Como se vê, é preciso estudar cada caso apresentado para identificar para ele a melhor solução cabível dentre as disponíveis, SE cabíveis. Os precedentes abaixo exemplificam a solução da Usucapião quando em tese apenas outro “remédio” seria a solução para a “enfermidade” imobiliária:
USUCAPIÃO EM CASOS DE HERANÇA / INVENTÁRIO:
“TJDF. 0714636-57.2020.8.07.0001. J. em: 04/08/2021. APELAÇÃO CÍVEL. IMÓVEL OBJETO DE HERANÇA EM INVENTÁRIO. USUCAPIÃO. POSSIBILIDADE. CONDOMÍNIO ENTRE HERDEIROS. INTERESSE PROCESSUAL. PRESENTE. POSSE AD USUCAPIONEM. REQUISITO AFETO AO MÉRITO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. PRECOCE. SENTENÇA TORNADA SEM EFEITO. (…) 2. Apesar de o imóvel integrar o rol de bens a serem objeto de inventário, sendo, em princípio, indivisível após aberta a sucessão e pertencente em co-propriedade e condomínio a todos os herdeiros (art. 1.791, parágrafo único, CC), vislumbra-se ser possível, em tese, ao herdeiro interessado postular em Juízo a USUCAPIÃO do bem a fim de obter a constituição de propriedade exclusiva em seu favor, desde que demonstre efetivamente o cumprimento de todos os requisitos legais para a declaração da prescrição aquisitiva. Precedente do STJ. (…). 4. Recurso da autora conhecido e provido. Recurso da ré prejudicado”.
USUCAPIÃO EM CASOS DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA:
“TJSP. 1070011-04.2018.8.26.0100. J. em 10/09/2018. 1ª VRP/SP. Registro de Imóveis – Dúvida – Usucapião Extrajudicial – Negativa por parte do oficial – Alegação de que a autora deveria ingressar com ação de adjudicação compulsória, vez que possui direitos de compromissária compradora registrados na matrícula – Descabimento – Oficial que só pode negar o prosseguimento do feito quando não preenchidos os requisitos previstos nos arts. 3° e 4° do Provimento n° 65/2017 do CNJ – Compromisso de compra e venda que é documento apto ao ingresso do pedido de usucapião extrajudicial – O fato de a autora poder ingressar com adjudicação compulsória NÃO A IMPEDE DE OPTAR PELA USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL, quando preenchidos os requisitos normativos – Eventual cautela do Oficial em relação ao recolhimento do ITBI poderá ser sanada com notificação à Municipalidade narrando sua suspeita de irregularidades – Dúvida improcedente”.
“TJRJ. 0101669-64.2018.8.19.0001. J. em 08/11/2018. APELAÇÃO. DÚVIDA REGISTRAL. USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL. (…) JUSTIFICATIVA À NÃO ESCRITURAÇÃO CORRETA DAS TRANSAÇÕES E AO NÃO AJUIZAMENTO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. (…). II) Espécie em que, porém, o Oficial rejeitou, com espeque no art. 13, § 2º, do Provimento CNJ 65/2017, a justificação da interessada pela OPÇÃO da via da usucapião extrajudicial em detrimento da ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. (…) V) Se, pois, a parte preenche os requisitos à aquisição da propriedade por usucapião “e a presente dúvida suscitada não verticaliza tais circunstâncias”, é-lhe facultado promover assim a demanda de USUCAPIÃO como requerer sua declaração extrajudicial, nos termos da novel legislação de regência, sem que, com base apenas nessa LÍCITA ELEIÇÃO, se cogite de burla fiscal, até porque, tendo, em tese, adquirido originariamente a propriedade, NÃO LHE É MANDATÓRIO que se valha de mecanismos próprios da aquisição derivada; máxime no caso dos autos, em que a parte interessada sequer logrou localizar a vetusta proprietária registral do imóvel” (…)”.
Original de Julio Martins
Fonte: Jornal Contábil
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