Quando o Banco Central lançou o Pix, em novembro do ano passado, jamais poderia imaginar, que seu sistema de pagamentos instantâneos, iria causar uma batalha judicial entre os maiores bancos do país.
Na verdade o que aconteceu foi que, pouco depois do lançamento do novo serviço do Banco Central, o site Cointelegraph através de documentos de um processo, divulgou que o banco Itaú tinha cometido uma falha, em novembro de 2020, logo depois do lançamento do meio de pagamentos.
Segundo o que foi publicado, o Itaú cometeu uma falha grave em sua integração com o sistema do BC (Banco Central) e acabou realizando transferências indevidas para as contas de diversos bancos.
As instituições em questão são o Banco do Brasil, Bradesco, Sicred, Bancoob, Nubank, Banco Original e Banco Inter. Estas instituições foram processadas pelo Itaú.
“Em razão de um erro sistêmico, foram realizadas transferências indevidas e, portanto, em excesso, para as contas bancárias dos bancos favorecidos (em simples explicação: houve débito de X e crédito de X + X) (…) Esse tipo de falha sistêmica ocorre com alguma frequência no âmbito das instituições financeiras”, destaca o Itaú na ação.
O valor transferido pelo Itaú, que consta no processo, foi de R$ 966.392. As transferências foram feitas em duplicidade, de forma indevida.
Para o Itaú, embora a falha tenha sido exclusivamente de seu sistema, os bancos envolvidos estariam “cientes da falha sistêmica” e que, segundo o banco, mesmo essas instituições sabendo do erro, não devolveram o dinheiro e ainda permitiram aos seus clientes utilizar o valor transferido indevidamente.
“E os Réus, ainda que cientes da falha sistêmica quando o valor ainda estava sob a sua ingerência, ao invés de devolverem o valor indevido ao Autor, permitiram a liquidação dos créditos nas contas dos correntistas destinatários, impedindo o estorno e causando o enriquecimento sem causa em relação ao qual ora se pleiteia devolução de valores”, diz o Itaú, no processo.
Itaú entra em contato com clientes
O Itaú, assim que ficou sabendo da falha, como divulgado em um documento, entrou em contato imediatamente com alguns correntistas para que estes entrassem em contato com os destinatários das transferências e resolvessem a devolução de forma imediata.
“Tanto que alguns valores foram recuperados. Em paralelo, o Autor enviou e-mails aos Réus (outros bancos), onde relatou o ocorrido, especificou os valores e solicitou o imediato estorno. (…) A questão operacional poderia ser resolvida se os Réus não tivessem sido omissos, mesmo cientes do erro sistêmico”, alega o Itaú.
Entretanto, alguns bancos e correntistas não fizeram o estorno das transações indevidas, o que levou o Itaú a pedir que os bancos sejam condenados a bloquear e, na sequência, estornar ao autor os valores creditados em excesso.
Além disso, como pedido sucessivo, nas situações nas quais o estorno não for possível (em virtude de insuficiência de fundos na conta do favorecido), o Itaú pede que as instituições financeiras informem todos os dados dos clientes afetados para que o banco possa abrir um processo judicial contra eles.
“(…) Pede-se a condenação dos Réus na obrigação de fazer consistente na apresentação do nome, endereço, valor que não foi possível recuperar e CPF dos clientes cujos estornos não se efetivaram, para que o Autor possa exercer seu legítimo direito de propor ação judicial em face dos mesmos, para recuperação dos valores que efetivamente lhe pertencem, sob pena de enriquecimento sem causa dos favorecidos”, alega.
Quem pode reverter transações no Pix?
A Justiça acolheu as legações do Itaú e acabou determinando o bloqueio dos valores nas contas dos bancos envolvidos. Porém, o Banco do Brasil (BB) entrou com pedido no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) para rever a decisão e teve o pedido deferido.
“Cuida-se de agravo contra decisão que concedeu tutela de urgência para determinar aos réus para, em 48 horas, bloquearem quantias creditadas em duplicidade e proceder ao estorno de valores disponíveis nas contas de seus clientes. Concede-se liminar para suspender os efeitos da decisão agravada, presentes os requisitos, tendo em vista que, os valores foram creditados em duplicidade por erro sistêmico do Banco-agravado nas contas dos favorecidos através de transferências instantâneas (PIX), encontrando-se na esfera patrimonial dos correntistas”, destaca a decisão do pedido feito pelo BB.
O Banco do Brasil alega que, o pedido do Itaú para que as instituições financeiras façam bloqueios automáticos nas contas dos clientes é ilegal, pois não pode ser iniciada de instituição para instituição, mas a partir do cliente.
“(…) Referida decisão se mostra ilegal, haja vista que a legislação norteadora das condutas relacionadas ao Pix, mais precisamente o Capítulo XI da Resolução BCB nº 1 de 12/08/2020 (doc. anexo), que trata “da devolução das transações”, prevê, em seu art. 40, §1º, que “ A devolução de um Pix deve ser iniciada pelo usuário recebedor”, ou seja, não há previsão para que a devolução seja realizada pela Instituição Financeira na qual mantém sua conta”, alegou o BB.
A normativa do Banco Central (BC) sobre o modo como funciona o Pix, diz que, a devolução de valores entre as instituições financeiras, no caso do Pix, podem ser realizadas, mas a partir da ordem do cliente:
“Art. 40. Poderão ser objeto de devolução, total ou parcial, os recursos de determinada transação realizada cujos fundos já se encontrem disponíveis na conta transacional do usuário recebedor.
1º A devolução de um Pix deve ser iniciada pelo usuário recebedor.
2º É permitida a realização de múltiplas devoluções de uma mesma transação.
Art. 41. Na iniciação da devolução, o usuário recebedor deve informar ao seu prestador de serviço de pagamento o valor e o motivo da devolução.
Parágrafo único. O participante deve debitar o valor informado na conta transacional do usuário recebedor, após sua autorização, e remeter os fundos ao participante prestador de serviço de pagamento do usuário pagador, informando o motivo da devolução.
Art. 42. A solicitação de devolução de um Pix deve ser iniciada, no máximo, em até 90 (noventa) dias da data da transação de pagamento original”, diz a resolução do Banco Central.
BC também pode ‘reverter’ transações
Mesmo a resolução do BC declarando que o cliente tem que solicitar o reembolso da transação, em setembro do ano passado o chefe-adjunto do Departamento de Competição e de Estrutura do Mercado Financeiro do Banco Central, Carlos Eduardo Brandt, revelou que o BC, que controla o sistema, também pode alterar as transações no Pix.
Conforme foi declarado por ele naquele momento, deixa claro que, se uma transação for confirmada e, após a confirmação, o Banco Central entender que ocorreu uma fraude, ele poderia reverter a transação sem perguntar ao recebedor:
“Se houver comprovação de fraude, será possível fazer reembolso sem autorização da pessoa que recebeu o depósito”, informou na época.
O processo está sendo analisado pela Justiça e ainda não há nenhuma decisão final sobre o caso. O que tudo indica é que depois da abertura do processo judicial realizado pelo Banco Itaú, assim como as réplicas dos bancos, caso do Banco do Brasil, podem levar o BC rever as regras do Pix com relação à segurança e fraudes nas transações.
Edição por Jorge Roberto Wrigt Cunha – jornalista do Jornal Contábil
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Fonte: Jornal Contábil
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