Lei Maria da Penha completa 16 anos, mas Feminicídio no rio teve alta de 18,75% em 2022

Em setembro, a Lei Maria da Penha completou 16 anos. Entretanto, uma estatística preocupante: o feminicídio, em seis meses, teve aumento de 18,75% no Estado do Rio. Segundo o levantamento do Instituto de Segurança Pública (ISP), de janeiro a junho deste ano foram 57 mulheres mortas. Em 2021, no primeiro semestre, foram 48 casos. Já as tentativas de feminicídio subiram 11,07%. E no ano passado, de janeiro a junho, foram 128 tentativas de feminicídio. No mesmo período neste ano, foram contabilizadas 143. Quais são as penalidades? As mulheres ainda não se sentem à vontade para denunciar? O medo é o maior motivo? 

Em 7 de agosto de 2022, a Lei nº 11.340/06, mais conhecida como Lei Maria da Penha, completou 16 anos de vigência. Sua promulgação objetivava coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher visando a prevenção, punição, bem como impedir a permanência da continuidade dos delitos praticados – principalmente por meio das medidas protetivas –, inovação trazida por sua vigência ao nosso ordenamento jurídico.

É uma lei bastante abrangente pois engloba as diversas formas de violência que a mulher pode ser vítima por sua própria condição: física, sexual, psicológica, patrimonial e moral.

Posteriormente à vigência desta Lei, o legislador pátrio decidiu ampliar o campo de proteção à mulher, estabelecendo nova e mais gravosa pena para quem pratica o delito de homicídio por motivo da condição do sexo feminino da vítima. Criou-se, portanto, a figura jurídica do feminicídio, qualificadora do delito previsto no art. 121, do Código Penal, aplicando-se ao autor do fato a pena de 12 a 30 anos de reclusão (art. 121, § 2º, VI, do CP).

Ainda neste diapasão, houve a tipificação da conduta denominada como violência psicológica, que apesar de constar na Lei Maria da Penha, carecia de maior atenção do legislador. Assim, promulgou-se a Lei nº 14.188, de 2021, a qual inclui o art. 147-B, do Código Penal, que estabelece os núcleos do tipo penal, bem como a pena de reclusão – também mais grave –, de 6 meses a 2 anos.

Apesar da promulgação e vigência de leis que criam novos delitos, ou aumentam as penas de condutas anteriormente previstas na norma penal, os dados estatísticos do Instituto de Segurança Pública do Janeiro apontam um aumento em 18.75% dos casos de feminicídio, consumado ou tentado. A que se deve este aumento?

Em primeiro lugar, deve ser ressaltado a questão histórica e cultural que envolve a violência doméstica. O senso comum e anacrônico da sociedade brasileira é de que a mulher era destinada a cuidar da família e do lar, além de ser “objeto sexual dos desejos masculinos”; enquanto ao homem cabia trabalhar e trazer o sustento econômico da família. Desta forma, ao homem cabia o espaço público, a rua; enquanto à mulher, a sua residência, formando-se, desta maneira, dois mundos: o mundo externo, que produz e domina, e o mundo interno, submisso e destinado à reprodução. Um mundo ativo e outro passivo, portanto.

Esta forma de pensamento colocaria o homem sempre em um patamar hierarquicamente superior à mulher, gerando desigualdade de gênero e, portanto, um desequilíbrio social. Some-se ao desequilíbrio social a questão financeira, de o homem ser, na maioria das vezes, o provedor do lar e a mulher sua dependente financeira, além da questão física, de o homem ser mais forte fisicamente do que a mulher. Temos, então, um ambiente propício ao abuso, historicamente aceito pela sociedade brasileira.

Foi, portanto, incorporada aos costumes brasileiros a cultura da dominação da mulher o que, indubitavelmente, leva à violência de gênero. O ciclo, uma vez instaurado, baliza o relacionamento e, levado ao extremo, acarreta a morte das mulheres e ao crime feminicídio.

Trazendo esta questão para os dias atuais, pode-se observar que a grande maioria de tais costumes ainda permanece arraigada em nossa sociedade, resquício do ciclo histórico da cultura do machismo.

Aliado a esta cultura, temos o medo que a vítima possui em comparecer às delegacias e reportar os delitos dos quais foi vítima à autoridade policial. Medo de ser julgada durante o atendimento por policiais pouco ou nada qualificados, medo de que o registro de ocorrência não a proteja da forma almejada, medo da represália que sofrerá posteriormente, a partir do momento em que sair da sede policial.

O raciocínio das vítimas funciona desta forma: “após a concessão da medida protetiva, quem garantirá o seu cumprimento?” O desamparo das mulheres que se encorajam e comunicam o delito à polícia judiciária vai ao encontro da ausência de políticas públicas por parte do Estado.

A ausência do Estado nos diversos setores da sociedade fomenta o aumento dos casos de feminicídio. Via de regra, a vítima deste delito vem padecendo de outras modalidades de violência que, com o tempo, culminam em morte. É o “ciclo da violência” que mencionamos acima. Tais delitos poderiam ter sido evitados com atuação mais abrangente das instituições estatais, que deveriam agir de maneira preventiva, com o objetivo de evitar a ocorrência do delito, mas não o fazem.

Importante ressaltar que a referida qualificadora do delito de homicídio não abrange apenas os delitos praticados no âmbito da violência doméstica, mas de toda violência empregada contra a mulher, por razões do gênero feminino. Desta forma, o aumento dos delitos de feminicídio no Rio de Janeiro não guardaria relação, exclusivamente, aos crimes praticados sob égide da Lei Maria da Penha.

Em resumo, não há que se falar em recrudescimento das penas dos delitos, tampouco da criação de novos tipos penais, se o Estado e suas instituições não abraçarem a ideia de prevenir a ocorrência do crime. É de suma importância a criação de políticas públicas contra a violência à mulher; sobre a igualdade de gênero; a criação de modelos de acolhimento profissional multidisciplinar que sejam efetivos à mulher vítima; melhor aparelhamento e treinamento dos policiais em todas as delegacias fluminenses – não somente os das especializadas –; a fiscalização efetiva do cumprimento das medidas protetivas e, por último, a efetividade da punição do agressor. A falha do Estado, relembre-se, é a corresponsável pelas mortes das vítimas, seja por ação ou omissão.

Por Alexandre Corrêa, Advogado Criminalista, sócio do Escritório Carvalho Côrtes Advogados

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Fonte: Jornal Contábil
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