“Limbo” regulatório sobre operações de risco sacado contribuiu para falta de transparência no balanço das Lojas Americanas, diz professor da FEA-USP

O “limbo” regulatório abriu espaço para que as Lojas Americanas, uma das maiores varejistas do país, deixasse de contabilizar adequadamente uma dívida de R$ 20 bilhões com fornecedores, disse Fernando Dal Murcia, professor de contabilidade da FEA-USP, diretor da FIPECAFI e especialista contábil. A Americanas admitiu uma “inconsistência contábil” na operação de risco sacado, quando a varejista paga um fornecedor usando um empréstimo bancário.

“(O risco sacado) É uma coisa meio sui generis. Ela nasce como operacional, porque você está comprando mercadoria, mas, no final, você envolve um banco (tomando empréstimo). Aí o fornecedor recebe e o varejista paga o banco depois. Fica no limbo, e as normas contábeis não têm regramento específico”, argumenta Murcia, que também é especialista contábil e fez parte da equipe que investigou inconsistências contábeis na Via Varejo.

Não há regras contábeis específicas para esse tipo de operação, acrescenta o especialista. “Se vai estar no passivo circulante, na linha de fornecedores ou empréstimo/ financiamento, as regras não deixam isso tão claro. Ela vai mais para a lógica de analisar a essência da operação.”

Contabilização do risco sacado

As inconsistências em lançamentos contábeis redutores da conta fornecedores da ordem de R$ 20 bilhões, comunicada pelas Americanas em 11/01, se referem ao risco sacado ou forfait, operação entre varejista, fornecedor e banco. A varejista compra do fornecedor a um prazo ‘x’ para pagamento e honra o compromisso com o dinheiro que tomou emprestado de um banco, com data de vencimento superior ao do fornecedor.

Prática comum no setor varejista, as operações de risco sacado são lançadas na conta de fornecedores, e os juros pagos são registrados em uma conta redutora de fornecedores. Pelo perfil da operação, ela deveria ser lançada como empréstimo bancário, observa Murcia.

“A lógica é muito mais de dívida bancária do que operação com fornecedor. Mas as empresas lançam como passivo com fornecedor, porque, se registrassem como empréstimo, poderiam esbarrar nas cláusulas contratuais que restringem o montante de dívida financeira que elas podem contrair”, argumenta.

O que diz a CVM

A CVM (Comissão de Valores Mobiliários), órgão que fiscaliza operações financeiras que envolvem bancos e mercado de capitais, publicou algumas instruções recomendando a classificação das operações conforme a sua natureza. Vale lembrar que os ofícios não têm força de lei.

No ofício 01/2020, por exemplo, consta que “é inequívoco o entendimento de que houve um financiamento da companhia compradora de mercadorias ou bens de capital por parte de uma instituição bancária (referência ao risco sacado). O passivo oneroso deve ser como tal reconhecido no balanço patrimonial e o serviço da dívida (juros e demais encargos) deve ser apropriado tempestiva e exponencialmente em resultado conforme curva efetiva de juros. Há com isso elisões a “covenants” bem usuais, como por exemplo: EBITDA/Endividamento; EBITDA/Juros; Endividamento/PL.”

Em outro ofício (01/2021), a comissão entende que “os auditores devem dedicar especial atenção a estas operações, sobretudo quando envolverem companhias altamente alavancadas (endividadas), pelo potencial risco de distorção da realidade econômica a ser reportada (gerenciamento de estrutura de capital)”.

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Fonte: Portal Contnews
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