A questão do pagamento do IPTU na posse de imóvel não é preponderante, mas pode ter sua importância
A dúvida é recorrente nas consultas relacionadas a propensos casos de regularização pela Usucapião (judicial ou extrajudicial)…
Objetivamente, o simples fato do pagamento do IPTU não confere o condão de garantir a aquisição de bem imóvel através de Usucapião. Na verdade é o preenchimento dos requisitos legais prescritos para a modalidade de Usucapião pretendida é que será decisivo e fatal para definir o reconhecimento/procedência da aquisição – sendo certo e nunca demais relembrar que a sentença (na via judicial) ou o reconhecimento extrajudicial (se manejado o pedido pela via cartorária) terão caráter meramente declaratório – como há muito já assentou doutrina e jurisprudência. Ou seja,
“preenchidos os requisitos legais, a propriedade imobiliária se adquire mediante prescrição aquisitiva – usucapião – servindo a sentença judicial ou o reconhecimento oriundo do procedimento extrajudicial – apenas para formalizar a aquisição e ingressar no RGI conferindo oponibilidade, disponibilidade e publicidade ao novo titular registral.
A respeito da questão do pagamento do IPTU, assim já se pronunciou o TJRJ, corroborando sua utilidade como prova (mas não sua obrigatoriedade):
“TJRJ. 0010273-90.2006.8.19.0012 – J. em 03/12/2019. Apelação Cível. Direito Civil. Ação de Usucapião. Reintegração de posse ajuizada pelo espólio do então proprietário sob a forma de reconvenção, com fundamento em esbulho possessório. Sentença que julgou procedente a pretensão de usucapião e rejeitou a pretensão possessória formulada pelo réu/reconvinte. Decisão que se mantém. (…). Depoimentos que, examinados em conjunto com a prova documental apresentada, consistente em cópia de proposta de compra datada de 24 de novembro de 1968 e em diversos comprovantes de pagamento de IPTU emitidos em nome do primeiro autor, corroboram, ainda, a alegação autoral de que se trata de posse muito antiga, com lapso temporal superior ao exigido pela lei para o reconhecimento da usucapião extraordinária (20 anos, conforme art. 550 do Código Civil de 1916). (GRIFAMOS).“
“TJRJ. 0001315-50.2008.8.19.0205 – APELAÇÃO – J. em 07/04/2016. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSO EXTINTO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. AUSÊNCIA DE MATÉRIA EXCLUSIVAMENTE DE DIREITO. (…). ERROR IN PROCEDENDO. NULIDADE DA SENTENÇA QUE SE RECONHECE. PRECENTES. Compulsando os autos, de fato, constata-se que razão assiste aos recorrentes, uma vez que, no caso dos autos, não se pode aventar em julgamento antecipado da lide, uma vez que, ao contrário do sustentado pelo sentenciante, não se cuida de questão exclusivamente de direito, sendo necessário, assim, a dilação probatória. Além disso, há nos autos certidões imobiliárias com indicação da cadeia sucessória, a planta dos imóveis que pretendem usucapir, comprovante de pagamento de IPTU, que embora não conste os nomes dos autores, estão quitados, sob a guarda dos requerentes, servindo, por evidência, como meio de prova. (…). CONHEÇO DO RECURSO PARA DAR-LHE PROVIMENTO, ANULANDO A SENTENÇA. (GRIFAMOS)“
A bem da verdade, não é requisito legal nem expresso que haja pagamento de IPTU pelo ocupante/usucapiente – e por isso não pode ser óbice no procedimento de usucapião judicial nem extrajudicial – e mesmo nem poderia ser (em que pese a regra do art. 32 do CTN), já que por exemplo a Lei assim não exige para fins de prescrição aquisitiva.
Necessário sublinhar que a obrigação de pagar IPTU surge para o usucapiente na mesma medida e momento em que, preenchidos os requisitos legais, adquire este também a propriedade imobiliária, certo que, s.m.j., a Municipalidade fará jus à cobrança dentro do quinquênio legal dos tributos pela propriedade, valendo pontuar que os efeitos da usucapião retroagem à data do início da posse, como oportunamente já disse o STJ (REsp Nº 1.378.686/RS).
Por fim, a respeito da questão, o TJRS também já se manifestou:
“TJRS. Apelação Cível 70045744604 – J. em 31/01/2012. APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. posse mansa e pacífica. prova suficiente. simples notificação para desocupação não comprova existência de comodato anterior. ausência de pagamento de iptu. irrelevância, para fins de usucapião. 1. É de ser mantida sentença que reconheceu a usucapião extraordinária, diante de prova uníssona no sentido de que os autores mantém posse mansa e pacífica sobre o imóvel usucapiendo há mais de trinta anos. 2. (…) 3. É irrelevante, para fins de usucapião, que o usucapiente não tenha pago os tributos incidentes sobre o imóvel. Caso os tivesse pago, tal fato seria considerado um bom indício da existência de animus domini. A ausência do pagamento, porém, não desqualifica automaticamente a posse do usucapiente, mormente diante do restante das provas produzidas. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (GRIFAMOS).“
Importante ressaltar que, caso o interessado/usucapiente pretenda pagar o IPTU do imóvel ocupado, deve ter a cautela de guardar comprovação certa e inequívoca (muito fácil hoje em dia) de que é seu dinheiro quem está custeando aquelas taxas, desimportando que tais taxas, inclusive, venham em nome de terceiros ou em nome do então titular registral, como já asseverou o TJRJ:
“TJRJ. 0000225-56.2005.8.19.0061 – APELAÇÃO – J. em 20/09/2016. USUCAPIÃO. (…). Com relação a argumento de que tais documentos estão em nome de terceiros, melhor sorte não lhe ampara, pois, se o apelado pretende usucapir o imóvel, certo que seu nome não consta dos comprovantes de pagamento do IPTU, e demais taxas de serviço, bastando-lhe a comprovação da posse de tais documentos com a devida comprovação de pagamento. Além disso, merece destaque os documentos de pastas nº 000289/395, os quais, inclusive, foram emitidos já com o nome do autor. O autor usa, de forma efetiva, o imóvel, e preencheu os requisitos inerentes à usucapião, razão pela qual a sentença deve ser mantida. Recurso desprovido, nos termos do voto do desembargador relator. (GRIFAMOS).“
Por fim, a definição da ilustre Des. RENATA MACHADO COTTA (Proc. 0029103-38.2011.8.19.0042), acerca do fenômeno da Usucapião que pela sua exemplar clareza e precisão de sempre merece ser repetida:
“Modo originário de aquisição de propriedade e de outros direitos reais, a usucapião decorre da posse prolongada da coisa, acrescida de demais requisitos legais. Com efeito, a posse é o poder de fato sobre a coisa; já a propriedade é o poder de direito nela incidente. O fato objetivo da posse, unido ao tempo – como força que opera a transformação do fato em direito – e a constatação dos requisitos legais, confere juridicidade a uma situação de fato, convertendo-a em propriedade”.
Conteúdo original: Dr. Julio Martins
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Fonte: Jornal Contábil
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