O cheque é uma ordem de pagamento (à vista ou a prazo) que deve ser compensado no ato da sua apresentação pelo beneficiário ao banco sacado. Caso não haja o pagamento, em se tratando de um título de crédito, o favorecido poderá protestá-lo ou executá-lo em ação judicial, sendo a data nele indicada a referência para a contagem dos prazos de apresentação e de prescrição, segundo a legislação vigente.
Nos termos da Lei nº 7.357/1985, o cheque deve ser apresentado ao banco pelo beneficiário, a contar da sua emissão, no prazo de 30 dias, quando emitido em lugar onde houver de ser pago (mesma praça) ou em 60 dias quando emitido em outro lugar do país ou no exterior (praça diferente). Findo este prazo, o cheque prescreve em seis meses a contar da expiração do prazo de apresentação, não podendo mais o beneficiário promover a execução para o recebimento deste crédito, sem prejuízo do ajuizamento de ação de enriquecimento ilícito e de ação fundada na relação causal, ambos após o transcurso do prazo para a execução cambial.
Uma prática corriqueira no mercado, no entanto, é o endosso deste título, quando o beneficiário transmite a posse e os direitos do crédito a um terceiro, o qual passa a ter legitimidade para promover a cobrança da dívida, apesar de não possuir relação jurídica com o emissor do cheque (devedor).
Tanto que discussões envolvendo esta transação recentemente foram objeto de análise pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Recurso Especial nº 1.536.035. No caso em específico, dois cheques foram endossados a terceiro e protestados pelo portador após o prazo de prescrição para a promoção da execução, razão pela qual o autor (emissor do título) ingressou com a ação pleiteando a declaração de prescrição do débito e a baixa do protesto, bem como o pagamento de indenização por danos morais.
Em que pese o protesto tenha sido realizado após o transcurso do prazo prescricional, o detentor do cheque é considerado portador legítimo e o título ainda poderia ser cobrado por outras vias (ações supramencionadas) nos cinco anos posteriores ao término do prazo de prescrição para a execução. Assim, a Corte decidiu que o protesto de crédito prescrito, por si só, não gera automaticamente o direito à indenização por danos morais e negou o pedido formulado pelo emissor dos títulos.
A relevante decisão que indeferiu o requerimento de indenização fundamentou-se nas circunstâncias que caracterizam o dano moral, quais sejam, o abalo de crédito e a imagem de mau pagador decorrente do ato. Isso porque, se o cheque está prescrito – significando que não poderá ser executado, embora possíveis outras medidas de cobrança judicial –, “não há direito da personalidade a ser legitimamente tutelado”, uma vez que inexiste o abalo de crédito, conforme discorreu o relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão. Ele acrescentou, ainda, que “não só não houve o efetivo dano ocasionado, como é certo que o autor não nega que deve, tampouco manifesta qualquer intenção em adimplir o débito”.
O ato de protestar o crédito após o prazo prescricional, portanto, não justifica o dever de indenizar quando não há um efetivo dano ao bem jurídico tutelado, potencializando a premissa de que o dano moral não é presumido e de que incumbe à parte que se diz lesada comprovar uma efetiva lesão e o prejuízo decorrente do ato.
A decisão da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, neste sentido, alinhou-se ao posicionamento da Terceira Turma, que já se manifestou sobre o tema, no sentido de que o devedor em atraso no pagamento da dívida passível de cobrança por outros meios não pode se sentir moralmente ofendido por um ato que ratifica a sua inadimplência.
Por Camilla Oshima, advogada do Departamento de Contencioso e Arbitragem da Andersen Ballão Advocacia.
Andersen Ballão Advocacia – Fundado em 1979, o escritório atua na prestação de serviços jurídicos nas áreas do Direito Empresarial e Comercial Internacional.
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Fonte: Jornal Contábil
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