Não se fala de outro assunto. A greve dos caminhoneiros afetou o país inteiro de uma forma que poucos poderiam imaginar, sendo a grande dor de cabeça dos representantes do Governo Federal nos últimos dias. Falta de alimentos nos supermercados, postos sem gasolina, hospitais sem medicamentos, era a realidade vivenciada enquanto as reivindicações dos transportadores não fossem atendidas.
Até quando se anunciou o atendimento das mudanças exigidas o transporte de cargas continuou inerte, prejudicando a rotina de milhões de brasileiros. Mas a escassez parece ter chego ao fim, com algumas conquistas pelo setor.
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Dentre as mudanças, destaca-se a redução das Contribuições PIS e COFINS sobre o Óleo Diesel, ao fim de diminuir o preço do combustível utilizado pelos transportadores, que reclamam da instabilidade do valor cobrado pelos postos. A medida afetará os cofres públicos na ordem de R$ 10 bilhões por ano, já tendo uma contrapartida para compensar a perda de receita pública. Trata-se da reoneração da folha de salários, que impactará, dentre outras, empresas do varejo, de hotelaria e diversos seguimentos da indústria.
O Projeto de Lei que trata do assunto já foi aprovado na Câmara e no Senado, reduzindo para zero a alíquota das Contribuições PIS e COFINS sobre o Óleo Diesel até 31 de dezembro de 2018, bem como impondo a reoneração da folha de salários das empresas. No entanto, o Presidente da República vetou a parte que se refere à redução tributária, mas sancionou a medida que irá aumentar a arrecadação.
Assim, restou confirmado o aumento da carga tributária por meio da reoneração da folha de salários, mesmo não havendo a diminuição de PIS e COFINS esperada, ao menos por enquanto. Nesse contexto, importante se torna entender os efeitos da medida adotada pelo Governo Federal e como as empresas serão atingidas.
Desoneração da folha de salários
Como regra geral, as empresas devem recolher mensalmente à Previdência Social o valor equivalente a 20% (vinte por cento) da sua folha de salários, a título de Contribuição Previdenciária. Além disso, também devem recolher Contribuição para custear benefícios ligados ao risco no ambiente de trabalho (RAT), nos percentuais de 1% (um por cento) a 3% (três por cento), a depender do grau de risco de acidente, de acordo com a atividade da empresa, e Contribuições destinadas a terceiras entidades, tais quais SENAI, SESC, SEBRAE, SEST, INCRA, entre outras, a depender das atividades exercidas pela empresa, todas elas sobre a folha de salários e demais remunerações pagas a segurados da previdência social.
Ao fim de incentivar empresas de determinados seguimentos, no ano de 2011 foi editada Lei prevendo a substituição da Contribuição de 20% (vinte por cento) sobre a folha de salários para percentuais de 1% (um por cento) a 4,5% (quatro por cento e meio) sobre a receita bruta. Inicialmente a mudança era obrigatória, mas a partir de 2015, passou a ser facultativa.
A medida ficou conhecida como desoneração da folha de salários, que em alguns casos teve efeito bastante positivo, reduzindo a carga tributária suportada pelas empresas. Consequentemente, a arrecadação diminuiu, tendo vozes no sentido da irresponsabilidade da medida, que retiraria recursos da previdência em favor à classe empresária. Todavia, também não se deve perder de vista que a redução no custo da contratação de empregados gera diminuição de desemprego, favorecendo o desenvolvimento do país.
Reoneração da folha de salários e o planejamento das empresas
Com a publicação da Lei nº 13.670/2018, boa parte das empresas que são beneficiadas com a desoneração da folha e optam por recolher a Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB), será impactada, majorando-se a carga tributária a ser suportada e inchando a folha de salários, o que poderá repercutir em demissões e representa um ponto fora da curva no planejamento anual dos empresários.
Acontece que não se pode surpreender os contribuintes da noite para o dia. Sempre que o fisco pretenda majorar a carga tributária, deve respeitar os princípios da anterioridade anual e da noventena.
O primeiro veda a possibilidade de o aumento de tributos valer para o mesmo ano da mudança e o segundo prevê que a espera deve computar pelo menos noventa dias. Desse modo, uma majoração tributária ocorrida em junho de determinado ano, por exemplo, apenas valerá a partir de janeiro do ano seguinte. Contudo, se a Lei for aprovada em dezembro, terá que esperar noventa dias para passar a valer.
Todavia, a regra não é absoluta, comportando inúmeras exceções, dentre as quais se destaca o regime peculiar aplicado às Contribuições destinadas a financiar a Seguridade Social, que se submetem apenas à regra da noventena, não precisando respeitar a anterioridade anual. Por este motivo, a Lei que trata da reoneração da folha de salários previu que a medida passará a valer a partir do primeiro dia do quarto mês de sua publicação, ou seja, em 1º de setembro de 2018, respeitando os noventa dias.
Por outro lado, os contribuintes deviam optar no início de cada ano pelo regime de tributação com base na folha de salários ou sobre a receita bruta, de forma irretratável, conforme dispositivos da Lei que trata da desoneração. Por isso, é incoerente o fisco forçar o contribuinte escolher um regime a ser aplicado no ano inteiro e no meio do caminho mudar as regras do jogo. Para optar pela CPRB em detrimento da regra geral, as empresas fazem planejamentos anuais, crendo na fidelidade da adoção da norma pelo fisco.
Essa história, entretanto, não acontece pela primeira vez. Em 2017 alguns setores também foram prejudicados com a extinção da desoneração da folha no decorrer do ano, em prejuízo ao seu planejamento anual. Insatisfeitos, recorreram ao Judiciário, havendo decisões favoráveis, determinando que a regra valesse apenas para o ano seguinte, tendo em vista que as empresas optam em janeiro pelo regime de tributação de forma irretratável. Assim, se o contribuinte não pode mudar no meio do ano o fisco também não está autorizado a quebrar a regra.
A título de exemplo, vale transcrever trecho de decisão proferida pelo Des. Federal Amaury Chaves de Athayde, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
“Com efeito, o parágrafo 13 do art. 9º da Lei n.º 12.546/2011, trouxe, em seu bojo, ao menos três regras com conteúdo normativo bastante explícito: a) trata-se de opção do contribuinte escolher entre o regime de tributação sobre a folha de salários e a receita bruta; b) trata-se de uma opção com período de vigência certo e determinado, qual seja, todo o ano-calendário; c) trata-se de opção irretratável.
“Ora, diante de tais contornos bem definidos, os contribuintes elegeram a sua opção e, com base nela, planejaram suas atividades econômicas, seus custos operacionais e basearam seus investimentos. A alteração abrupta da forma de recolhimento da contribuição previdenciária, ainda que não viole a anterioridade mitigada, representa, a meu ver, flagrante inobservância à segurança jurídica, à proteção da confiança legítima e à boa-fé objetiva do contribuinte, princípios esses que são balizas, como dito, à integridade do sistema tributário. Ademais, poder-se-ia cogitar inclusive de violação ao ato jurídico perfeito, já que a opção do contribuinte deu-se em Janeiro de 2017.
“Não fosse isso suficiente, não há olvidar que não houve, pela Medida Provisória n.º 774/2017, revogação expressa do parágrafo 13 do art. 9º da Lei n.º 12.546/2011, fato esse que, por si só, neste momento, já daria azo à concessão da tutela de urgência almejada.
“Isso posto, defiro a antecipação da tutela recursal, para autorizar a impetrante a continuar recolhendo a contribuição previdenciária sobre a receita bruta até 31 de dezembro de 2017.” (TRF4, AI nº 5030748-82.2017.4.04.0000).
Portanto, mesmo que a Lei nº 13.670/2018 preveja a extinção da desoneração da folha de salários para diversos seguimentos a partir de 1º de setembro de 2018, como a opção pelo regime se dá de forma irretratável para o ano inteiro, as empresas que se sentirem prejudicadas podem questionar no Judiciário a quebra da regra da anualidade da opção, fazendo com que a mudança valha apenas a partir de 1º de janeiro de 2019, tendo precedentes judiciais favoráveis em situação idêntica ocorrida no ano de 2017.
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Fonte: jc