Criado para estimular a criação de novos empregos e fomentar a inovação, o Simples Nacional chega a 2019 sem atingir suas principais metas e contribuindo como maior fonte de gastos tributários do Brasil. Essas são as principais conclusões da pesquisa “Qualidade dos gastos tributários no Brasil: o Simples Nacional“, elaborada pela Escola de Direito de São Paulo e pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE).

O estudo conjuga três análises: a contribuição do Simples Nacional para os gastos públicos, o histórico que justifica seu surgimento e uma análise comparativa com outros regimes similares em países como Canadá, Coreia do Sul, EUA, Israel, Portugal e Reino Unido.

Renúncias Fiscais

A pesquisa compilou dados da Receita Federal sobre renúncias fiscais (que compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter específico e outros benefícios), que podem chegar a R$ 305 bilhões em 2019. Desse total, o Simples Nacional responde por R$ 87 bilhões, perfazendo 28,45% do total de gastos tributários do país. Em 20 anos, enquanto a soma total de renúncias cresceu 18 vezes, o equivalente ao Simples Nacional cresceu 168 vezes

Atrás do Simples Nacional, vêm os rendimentos isentos e não tributáveis do IRPF (9,55%), da Zona Franca de Manaus e áreas de livre comércio (8,55%), da agricultura e agroindústria – desoneração da cesta básica (8,55%) e das entidades sem fins lucrativos – imunes e isentas (8,33%).

Motivações

O Simples Nacional, como o conhecemos hoje, é regulamentado pela Lei Complementar 123, de 2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, e revogou a Lei 9.317/96. No entanto, os debates sobre a criação de um regime tributário específico para micro e pequenas empresas (MPE) remontam à década de 60.

Porém, foi só na exposição de motivos da Medida Provisória 1526/96, que deu origem à criação do Simples, que ficaram mais explícitas as motivações para a sua criação: combater a informalidade e capacitar as Micro e Pequenas Empresas para gerar mais emprego.

Um dado que salta aos olhos é a proporção dos incentivos fiscais com relação ao PIB de cada país. O Brasil lidera esse dado, com 1,2% do PIB, atrás do Canadá, com 0,2% do PIB, e de Chile e México, com 0,1% do PIB. Os gastos com incentivos fiscais na França, África do Sul, Índia e Argentina equivalem a menos que 0,1% do PIB.

Dados Comparados

A pesquisa também comparou o funcionamento dos sistemas de incentivo às pequenas e médias empresas com os que funcionam no Canadá, Coreia do Sul, EUA, Israel, Portugal e Reino Unido.

A comparação se dividiu em duas etapas. A primeira se debruçou sobre a concessão de benefícios fiscais, que são, por exemplo, regras que autorizam uma contabilidade simplificada para apuração de tributos, métodos presuntivos de apuração de tributos ou simples dispensa de recolhimento/registro para empresas/empreendedores que tenham faturamento muito baixo. Outra frente de comparação do trabalho analisou especificamente os custos dos contribuintes para cumprir suas obrigações com o fisco, que são chamados custos de conformidade. Para as micro e pequenas empresas, uma alta carga de custos com conformidade pode dificultar a sua evolução, por isso muitos países possuem mecanismos para redução dessa despesa.

Combinando as duas frentes, a primeira grande diferença entre o Brasil e os países que são objeto da pesquisa é a de que neles não existe um sistema simplificado para as MPE nos moldes do Simples, isto é, em que há substituição de vários tributos por um tributo único. Nesses países, assegura-se algum tratamento diferenciado às MPE em algumas poucas situações, com relação a tributos específicos.

Outro ponto importante de comparação entre os países foi em relação ao limite de faturamento para a concessão do tratamento diferenciado.

Conclusões

O limite de faturamento para que uma empresa possa usufruir do tratamento diferenciado no Brasil supera o dos outros países. Enquanto a média dos países analisados gira em torno de US$ 20 mil, no Brasil, esse faturamento chega a US$ 1,2 milhão. Entre os países analisados, o país com o limite de faturamento mais alto para determinação do regime simplificado é o Reino Unido, com US$ 104 mil.

Para Leonel Pessoa, pesquisador da FGV Direito SP responsável pelo estudo, a principal conclusão a ser extraída do estudo é que o Simples Nacional não conseguiu atingir seus principais objetivos, que são combater a informalidade e gerar mais empregos.

“No contexto em que o país está debatendo propostas de reforma tributária que promovam mais competitividade e um sistema tributário mais racional é importante debater se o Simples Nacional é um modelo eficiente para se estimular a criação de empregos e a inovação”.

Segundo o sumário executivo, “o tratamento tributário diferenciado a toda e qualquer MPE pode acabar beneficiando empresas não competitivas e não gerando emprego ou outro ganho social adicional que compense a perda de arrecadação com o programa, que, no Brasil, atinge montante elevadíssimo e que não está em sintonia com os parâmetros internacionais”.

Samuel Pessôa, pesquisador associado da área de Economia Aplicada do FGV IBRE e um dos participantes do estudo, destaca que o sistema se mostrou ineficaz. “O Criado para estimular a criação de novos empregos e fomentar a inovação, o Simples Nacional chega a 2019 sem atingir suas principais metas e contribuindo como maior fonte de gastos tributários do Brasil. “O Simples provoca elisão fiscal, é utilizado para contornar o pagamento de impostos e não tem impacto na produtividade nem na geração de emprego”. Para o especialista, o governo poderia pensar em alguma medida para geração de empregos de baixa produtividade, de um a um e meio salários mínimos, mas teria que ser acompanhado com atenção e testado para verificar sua eficácia.

Sobre o debate da reforma tributária que está no Congresso, Pessôa acredita que é fundamental aprovar a pauta, pois impactará os investimentos. “A reforma tributária tem que ser focada na redução do custo da conformidade da legislação. Além disso, é preciso eliminar essa incerteza sobre o sistema aprovando a reforma, para haver uma retomada mais forte do investimento”.

A pesquisa pode ser acessada na íntegra em http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/28315

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Fonte: Jornal Contábil
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