A PROMESSA DE COMPRA E VENDA é um importante instrumento utilizado nas transações imobiliárias. Como já falamos outrora, pode ser entabulada tanto por ESCRITURA PÚBLICA quanto por INSTRUMENTO PARTICULAR, sem prejuízo da regra do art. 108 que exige instrumento público para transações imobiliárias acima de 30 (trinta) salários – isso porque, considerando se tratar de um contrato preliminar, observa as regras do art. 462 do CC – e mesmo SEM REGISTRO no RGI poderá ser utilizada para fins de regularização via Adjudicação Compulsória como estabelece a Súmula 239 do STJ, desde 2000.
Necessário inclusive recordar que o Código Civil de 2002 em seus artigos 1.417 e 1.418 prestigiam e assentam o “Direito do Promitente Comprador”, elevado à categoria de Direito Real pelo art. 1.225 do CCB em seu inciso VII. Inobstante o referido verbete sumular do STJ, sempre fez parte da nossa recomendação a realização do REGISTRO da Promessa na matrícula imobiliária junto ao Cartório do RGI do imóvel para maior segurança do comprador já que com a providência adotada o contrato ganha publicidade e efeitos “erga omnes”, não permitindo que se possa alegar, no futuro, seu desconhecimento especialmente por terceiros. Realizada a Promessa, a regularização normalmente virá com a realização do Contrato definitivo de Compra e Venda (a chamada “Escritura Defintiva”), mas não são poucos os casos onde há muito já tenha sido realizada a Promessa, até hoje as partes não entabularam a Escritura Definitiva de Compra e Venda. Nesses casos, eternizado o registro da Promessa em favor de terceiros, seria possível a regularização em favor de eventual ocupante pela via da Usucapião (inclusive a EXTRAJUDICIAL, sem processo judicial, direto em Cartório) ainda que constando na matrícula o referido gravame?
A resposta é afirmativa, sempre amparada na condição de que tenham sido reunidos pelo pretendente os requisitos para aquisição exigidos por Lei para a modalidade de Usucapião mirada. A bem da verdade, esse tipo de assento realizado na matrícula confere, como se viu, direito de aquisição ao Promissário Comprador, porém ele, assim como o Titular Registral, terão seus “direitos” suplantados se permitirem que outrem, sobre seu imóvel, reuna os requisitos legais para a aquisição mediante Usucapião, embasados na POSSE qualificada (com animus domi), sendo a COISA hábil a permitir os efeitos da prescrição aquisitiva pelo TEMPO exigido por Lei.
A respeito da peculiar questão da existência de ônus e gravames sobre o imóvel usucapiendo a abalizada doutrina do ilustre Registrador LUIZ GUILHERME LOUREIRO (Registros Públicos – Teoria e Prática. 2021) esclarece:
“Não havendo impedimento legal ou obstáculo registral, procede-se ao registro da Usucapião. Cabne observar que a existência de ÔNUS REAL ou gravame na matrícula do imóvel usucapiendo não impede o reconhecimento extrajudicial da usucapião e respectivo registro da aquisição da propriedade. (…) Com efeito, se a aquisição originária da propriedade pelo novo titular implica, ainda que indiretamente, a EXTINÇÃO do direito do antigo proprietário, não há lógica em se afirmar, por norma infralegal, que o evento não extingue ‘encargos’ adminstrativos e judiciais, sem sequer identificá-los”.
De fato, como sempre repetimos, na Usucapião não se opera transmissão de propriedade de antigo dono em favor do novo titular, mas na verdade o reconhecimento da propriedade do novo titular CONTRA o direito do antigo, que se perde justamente quando nasce a nova propriedade sustentada pela prescrição aquisitiva que surge no exato momento da reunião dos requisitos legais. Não se trata de transmissão derivada mas sim transmissão originária, sem vinculação com o titular anterior que apenas perde sua propriedade enquanto surge para o novo o direito real pretendido através da Usucapião.
Importante também é recordar que tanto no processo judicial (se adotada a via JUDICIAL) quanto no procedimento extrajudicial (se adotada a via EXTRAJUDICIAL de que trata o art. 216-A da LRP/73) inclusive os titulares de direitos registrados ou “averbados” na matrícula deverão participar do procedimento (vide art. 10 do Provimento CNJ 65/2017, p. ex.,) ou, pelo menos ter sua citação editalícia realizada (art. 11), sob pena de nulidade.
O artigo 14 do referido Provimento 65/2017 que regulamenta a Usucapião Extrajudicial assevera:
“Art. 14. A existência de ônus real ou de gravame na matrícula do imóvel usucapiendo não impedirá o reconhecimento extrajudicial da usucapião”.
POR FIM, a jurisprudência do TJSC que com acerto evidencia esse importante efeito da Usucapião:
“TJSC. 0002345-45.2014.8.24.0020. J. em: 18/07/2017. APELAÇÃO CÍVEL. (…) USUCAPIÃO COMUM EXTRAORDINÁRIA. – PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DO CREDOR HIPOTECÁRIO. (1) DECLARAÇÃO DE DOMÍNIO. USUCAPIÃO. HIPOTECA. ÓBICE. NÃO CONFIGURAÇÃO. – A declaração de domínio pela usucapião FAZ DESAPARECER QUAISQUER DIREITOS REAIS então existentes sobre ela, tal como a hipoteca, com constituição anterior ou posterior ao início da posse ad usucapionem, de modo que sua existência não lhe serve de óbice, seja pela natureza declaratória da sentença de usucapião, com efeitos ex tunc, seja por se tratar de modalidade de aquisição originária da propriedade, não guardando relação de continuidade com a anterior. (…)”.
Original de Julio Martins
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Fonte: Jornal Contábil
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