Por Roberto Wik

Ouvi certa vez em uma palestra proferida pelo vocalista da banda Iron Maiden, Bruce Dickinson, a seguinte frase: “Eu não gosto de cliente (pausa)”. A plateia ficou chocada. Estarrecida. Mas a continuidade do discurso e a explicação que se seguiu fizeram com que todos realmente concordassem com essa afirmação. “Eu não gosto de cliente, eu gosto de fã.” Clientes vão embora quando ficam chateados, procuram o concorrente, deixam de se relacionar. Já com os fãs, a atitude é diferente. Alguém já viu fã de um time de futebol mudar de clube depois que ele perde um campeonato ou cai para a segunda divisão? Fã é incondicional, sente um entusiasmo desmedido por aquilo que idolatra. Luta, torce, vibra e atua sempre com aquilo que lhe faz bem e com propósito. E há mais: dentre as definições de fã, destacam-se ainda os sentimentos com os quais defende suas preferências: paixão, garra e tenacidade.

Essa introdução nos faz refletir sobre o que realmente buscamos quando tentamos atrair um novo cliente, torná-lo engajado e fiel. Estamos apenas olhando o lado cliente ou estamos dando atenção à figura do fã? Quando nos deparamos com métricas nas compras on-line de clientes, por exemplo, no varejo, de 1% de conversão, 43% de taxa de abandono do carrinho de compras e 31% de retorno do consumidor, quais poderiam ser esses valores se tivéssemos fãs em vez de clientes?

As empresas, sejam elas de manufatura, varejo ou bens de consumo têm buscado incessantemente conhecer mais e melhor seus clientes para atendê-los de maneira personalizada. E isso tem uma razão, ou melhor duas: 90% dos brasileiros acreditam que experiências de compra personalizadas os encorajariam a fazer mais compras, e 69% dos consumidores no Brasil estão dispostos a fornecer informações pessoais durante sua jornada de compra, desde que entendam o propósito desse compartilhamento e vejam valor para si – e isso é quase o dobro do valor experimentado nos EUA (que chega a 37%).

Ser capaz de responder o que, quando e como os compradores gostariam de fazer compras requer que as empresas passem a entender seus clientes mais pessoalmente. A maioria já coleta uma série de informações que oferecem suporte à personalização, mas apesar de ter esses dados em mãos, apenas 38% dos compradores acreditam que as empresas estão aprendendo sobre seus comportamentos e preferências pessoais, bem como raramente os usam para criar experiências personalizadas.

É muito frustrante, por exemplo, quando você realiza compras em um determinado supermercado por quase dez anos (isso seria um estágio de fã?), com compras semanais, identificando-se toda vez que lá está, e, depois, se por algum motivo reduz de forma substancial a frequência naquele estabelecimento – no caso de uma mudança de residência, por exemplo, e o varejista nem sequer o aborda para entender o que aconteceu. O que foi feito com aquela base de dados de consumo do consumidor durante os dez anos que lá esteve? Continuar somente o envio de ofertas pelo aplicativo não será suficiente para fazê-lo retornar e voltar a ser fã, ou pelo menos cliente.

E o resultado disso é uma perda de oportunidade, uma vez que 54% dos consumidores são mais propensos a estabelecer lealdade (movendo-se de cliente a fã) com a empresa que eles entendam que os conhece.

A personalização desempenha um papel importante no engajamento dos clientes quando isso é feito corretamente. E a chave para a personalização é a simplicidade ao fornecer conteúdo relevante no lugar e no horário certos. O conteúdo da comunicação é o que mais importa e é onde as empresas mais têm falhado, com ofertas que não são específicas para os produtos que os compradores desejam.

A arte de engajar e converter clientes em fãs

E agora? Temos um problema?

Pelo contrário, está aí uma oportunidade de ouro: 63% dos compradores estariam dispostos a responder a um pequeno questionário sobre si mesmos, se isso significasse que só seriam enviadas ofertas relevantes depois. Refraseando e reforçando: os consumidores estão dispostos a compartilhar suas informações para obter ofertas que lhes proporcionem valor e economia.

Experiências bem-sucedidas geram lealdade – como ter um fã. Uma experiência de compra personalizada simples e eficaz precisa ser assertiva, relevante e oportuna.

A busca pelo fã

Diferentemente do futebol, em que a lealdade em geral vitalícia é fruto do berço (ou da influência familiar e de colegas), a lealdade com produtos e serviços talvez seja o nirvana que as empresas buscam. Para isso, as marcas devem focar na fidelização de longo prazo com atenção a quatro pontos principais:

  1. Consistência na qualidade do produto, na promessa da marca e no atendimento ao cliente. Consistência gera confiança e senso de confiabilidade;
  2. Oferecer opções aos compradores – relacionadas a variedade de produtos, a programas de personalização, fidelidade ou recompensas, para que se sintam no controle de suas decisões;
  3. Construir conexões emocionais para que os consumidores sintam como as empresas se importam e os consideram como clientes valiosos. A emoção tem um impacto significativo na lealdade;
  4. Distribuir recompensas ou descontos juntamente com benefícios do programa de fidelidade, informações ou insights exclusivos, podem inspirar a retenção e ajudar a garantir uma conexão emocional ou validar a fidelidade de um cliente à marca.

Em suma, não presuma que todos os clientes estão interessados em todos os produtos e serviços que você oferece. Faça um balanço dos que estão sendo utilizados ou subutilizados ao entrar em contato formalmente com os clientes para entender realmente quais experiências são valorizadas e como elas podem resultar em satisfação ideal.

A partir dessas discussões com os clientes, ajuste sua estratégia de experiência do consumidor, traduzindo os insights em oportunidades de diferenciação, engajamento aprimorado, lealdade e vantagem competitiva. Quando os clientes se sentem surpreendidos por prazeres inesperados, eles se tornam mais propensos a aumentar seus gastos com a empresa.

Torne-se obcecado em entregar o que os clientes querem, não o que você acha que eles querem. Em vez de buscar clientes, atraia fãs.

*Roberto Wik é diretor de indústria e varejo da Cognizant no Brasil

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Fonte Jornal Contábil