A Assembleia Geral Ordinário e o artigo 159 da Lei das S.A.

O mês de abril é para as pessoas jurídicas o momento da aprovação de contas de sua administração em assembleia geral ordinária (AGO), que deve ser realizada até o dia 30, tanto nas sociedades limitadas quanto nas sociedades anônimas, de capital fechado e aberto, sendo ambiente que emergem diversos aspectos jurídicos importantes da relação entre sócios/acionistas, administradores e a sociedade.

A importância deste momento para as sociedades é tão grande que a Comissão de Valores Mobiliários – CVM emite, anualmente, por volta dos meses de fevereiro e março, ofício circular consolidando seu entendimento sobre a legislação societária aplicável às companhias abertas, inclusive em relação a procedimentos a serem por elas observados para a realização das AGOs. Neste ano, o Ofício Circular Anual 2024 CVM/SEP, de 07/03/2024, contém novidades a respeito do tema, consolidando o entendimento da autarquia sobre o exercício do direito de voto pelo acionista na AGO em determinadas ocasiões.

Não é à toa que a CVM confere relevância ao assunto, pois é a assembleia geral ordinária o foro anual para discussão de responsabilidades dos acionistas e dos administradores, o que está muito ligado à prestação de contas. De acordo com o art. 134, da Lei das S.A., os administradores devem estar presentes na AGO, assim como os auditores independentes, se houver, e a aprovação dos acionistas, sem reserva, das demonstrações financeiras e das contas, exonera de responsabilidade os administradores, dando-lhes quitação de sua gestão, salvo erro, dolo, fraude ou simulação.

À esta época, os editais de convocação já devem ser publicados e as demonstrações financeiras devem estar prontas, ser disponibilizadas aos acionistas/sócios e publicadas na forma da lei, quando aplicável, para que possam exercer seus direitos de voto na AGO. Para as companhias abertas, a exigência é ainda maior, requisitando-se também a disponibilização da proposta detalhada da administração sobre a destinação do resultado do exercício e do boletim de voto à distância, dentre outros.

Acerca da publicação das demonstrações financeiras, o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração – DREI, por meio da Instrução Normativa nº 01/2024, à exemplo do ofício circular anual da CVM, também consolidou o entendimento sobre a legislação societária, no sentido de que, para as sociedades limitadas de grande porte, a publicação das demonstrações financeiras é facultativa.

Já para as sociedades anônimas, as publicações devem ser realizadas em jornal de grande circulação do local da sede da companhia, inclusive em sua página na internet, sendo, ainda, para as companhias abertas necessária a divulgação na CVM, B3 e no site de relações com investidores da companhia. A exceção fica para as companhias fechadas que tenham receita bruta anual de até R$78.000.00,00, que poderão realizar suas publicações de forma eletrônica, podendo ser apenas na Central de Balanços do Sistema Público de Escrituração Digital, conforme Portaria ME nº 12.071/2021.

No dia do conclave, independentemente de constar da ordem do dia do edital de convocação, é possível aos acionistas proporem à assembleia deliberar acerca da ação de responsabilidade civil contra os administradores pela gestão feita no exercício social encerrado e pelos prejuízos causados ao patrimônio da empresa, devendo ser observado o art. 159, da Lei das S.A.

Como se pode ver, o exercício do direito de voto na AGO é de extrema importância, principalmente quando determinados acionistas ocupam também a posição de administradores da sociedade, o que é corriqueiro no cenário empresarial brasileiro.

Aqui, o art. 115, §1º, da Lei das S.A., vem à tona estabelecendo que o acionista não poderá votar na aprovação de suas contas como administrador, tampouco em quaisquer outras matérias que puderem beneficiá-lo de modo particular, ou em que tiver interesse conflitante com o da companhia.

Na doutrina e jurisprudência ainda há discussões sobre a natureza e abrangência desse conflito de interesses previsto no art. 115, da Lei das S.A., dividindo-se em duas teses: a tese do conflito formal, que propõe um impedimento prévio e formal para o exercício do direito de voto, e a tese do conflito material/substancial, que não reconhece a possibilidade de impedimento de voto, defendendo a avaliação da substância, posteriormente, do voto proferido.

Pois bem. Por meio do Ofício Circular Anual 2024 CVM/SEP de 07/03/2024, a CVM, em razão de julgamentos ocorridos em 2023, consolidou seu entendimento atual acerca da possibilidade de o acionista/administrador votar em relação à deliberação sobre a propositura de ação de responsabilidade civil contra si, no sentido de que as hipóteses de conflito de interesses do art. 115, da Lei das S.A., neste caso, devem ser interpretadas de acordo com a tese material/substancial e não com a tese formal.

Ou seja, de acordo com a orientação mais recente da CVM, o acionista/administrador pode sim votar em deliberações relacionadas à propositura da ação de responsabilidade prevista no art. 159, da Lei das S.A., devendo demonstrar, a posteriori, no mérito e de forma consistente, a inexistência de interesses conflitantes com os da companhia, podendo se valer, para esse propósito, de estudos técnicos, pareceres, opiniões de especialistas e de consultas a órgãos próprios independentes destinados a analisar a questão.

Caso proposta ação de responsabilidade civil contra os administradores da companhia aberta, tal ação é considerada, para fins das normas da CVM, como uma “demanda societária” cuja comunicação é obrigatória pela companhia, e que, agora, passa a ser prevista em um novo item específico do Ofício Circular Anual 2024 CVM/SEP de 07/03/2024.

Dessa forma, cada vez mais a preparação para a realização das AGOs, seja nas sociedades limitadas ou nas anônimas, tem se mostrado fundamental para a proteção dos direitos de administradores, acionistas e da própria sociedade, bem como para o desenvolvimento do ambiente acionário, não devendo ser encarada como mera formalidade legal, como ainda é feita por uma boa parte das empresas no Brasil, especialmente as empresas de capital fechado. Portanto, que todos os envolvidos neste processo estejam bem amparados para esta temporada de AGOs que acontece neste mês.

A Assembleia Geral Ordinário e o artigo 159 da Lei das S.A.

Artigo escrito por Tomás Bussamra Real Amadeo é advogado responsável pelas áreas de Direito Societário, Contratual e M&A do Chamon, Serrano e Amorim Advogados (CSA Advogados).

por Ela Comunica

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Fonte: Portal Contnews
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