Método para tornar menos dolorosa a experiência de uma demissão, para quem demite e para quem é demitido
Uma das coisas mais traumáticas na vida de uma pessoa é o momento de sua demissão. Os laços com a empresa em que se trabalha podem se tornar tão fortes que sua ruptura pode equivaler à perda de um ente querido. Some- se a isso o fato, muitas vezes comum, da relação de emprego rompida ser a fonte de sustendo de toda uma família, o que adiará projetos, postergará sonhos e reduzirá por tempo indeterminado a qualidade de vida dos seus dependentes.
Diante dessa realidade, indispensável que o empresário ou o gestor esteja muito bem preparado para encarar esse momento estressante. Sim, será sempre estressante: por mais que você tenha feito a lição de casa, ou seja, que tenha preparado a pessoa para aquele momento de forma a evitar que seja uma surpresa (por meio de feedbacks constantes ou por ter sido frequentemente transparente com relação aos rumos da empresa), o colaborador demitido raramente acredita que esse doloroso momento de fato vai chegar.
Esse fenômeno é alimentado por uma prática comum na cultura brasileira. É que a falta de processo de integração do profissional na empresa quando de sua chegada, aliado à ausência de indicadores de desempenho, fazem com que o empresário ou gestor demore muito para entender que o profissional não está desempenhando. Isso culmina na demora da decisão pela demissão, o que alimenta essa sensação de falsa estabilidade no colaborador.
Aliado a isso, o ato de demitir uma pessoa não é necessariamente o sonho de ninguém. Não é incomum que esse momento seja precedido de noites em claro, calafrios e uma boa dose de pânico. Embora estar no topo traga algumas vantagens, também traz uma gama enorme de responsabilidades inafastáveis. Dessas, a que traz a maior carga emocional talvez seja a de ter que executar a demissão de alguém.
Por conta dessa realidade, demitir um funcionário pode levar muito mais tempo do que seria o ideal, mas o momento sempre chega. Diante dele, por mais que uma conduta amável, um tom de voz sereno e muita assertividade possam ajudar, é certo que a ocasião requer técnica.
Por tudo isso, esse artigo relaciona 11 regras de ouro úteis para tornar esse momento o menos traumático possível, para a empresa, para o gestor e para o colaborador desligado.
- Seja breve
Essa derradeira conversa deve necessariamente levar poucos minutos. É o momento de dizer assertivamente ao colaborador que seu desempenho ou comportamento não alcançou o nível ou padrão que a empresa esperava.
Mas, para que essa brevidade não seja confundida com indiferença, você deve ter feito sua lição de casa antes. Ter tido frequentes conversas de feedback, registrando documentalmente o desempenho do colaborar e apontando os fatores onde ele (desempenho) se mostrou insuficiente, apontando qual é o nível satisfatório que a empresa almeja e os pontos a serem corrigidos para seu alcance.
Nessa linha, ter conferido ao colaborar suficiente treinamento e informação acerca de suas competências e responsabilidades, ajudará a tornar esse ato célere.
Tendo cumprido essas etapas, uma conversa de demissão não deveria ter um conteúdo maior do que o seguinte:
“Beltrano, temos conversado nos últimos meses sobre seu desempenho e/ou comportamento, e dado que não alcançamos padrões que esperávamos para a sua posição, estamos encerrando seu contrato de trabalho”.
Dito isso, entregue a carta de desligamento na mão do funcionário e tenha a consciência de que tudo o que você disser a partir desse momento será inútil, inócuo e desnecessário. Inútil porque o colaborador demitido não estará concentrado em absolutamente nada do que sair de sua boca a partir de então. Sua mente estará divagando acerca de todas as consequências desse rompimento, antecipando dores e prevendo mudanças. Inócuo porque, como veremos, não é o momento de mais uma reunião de feedback, já que isso já deveria ter sido feito muito antes, por inúmeras vezes inclusive. Desnecessário porque não se trata de dar mais uma oportunidade à pessoa e nem a hora de tentar cuidar de sua carreira.
- Não é hora de avaliação de desempenho
Como dito acima, a reunião de desligamento deve ser breve e objetiva, justamente porque tudo o que deveria ter sido avaliado você já avaliou (se cumpriu bem o seu papel). Não é o momento para tirar do bolso uma lista interminável de pontos de melhoria do colaborador que está diante de sua própria dispensa. Isso só tornará o momento mais longo, desagradável e torturante.
Não fazer do ato de demissão uma sessão de aconselhamento é atitude saudável. Portanto, o que deve ser dito nessa hora, com muita brevidade e objetividade, é que a relação de trabalho está rompida e que o que levou a empresa a essa decisão está contido na série de reuniões de feedback pretéritas.
Por outro lado, não há nada de errado em investir em palavras de encorajamento ao final desse processo. Prestar elogios sinceros a contribuições observadas ou fazer comentários francos sobre a facilidade com que a pessoa irá se recolocar no futuro (se isso for positivo e verdadeiro), não fará nenhum mal. Afinal, você estará diante de uma pessoa possivelmente arrasada com a perda do emprego e que alimenta um certo sentimento de humilhação, por mais habilidade que você tenha tido para noticiar sua decisão. Fazê-la se sentir um pouco melhor é mais do que uma obrigação como gestor ou empresário: é uma responsabilidade como ser humano.
Só não deixe de observar a regra de ouro número um: seja breve!
- Faça isso apenas se estiver tratando pessoalmente
É fortemente desaconselhável que se utilize qualquer outro meio para a dispensa de um colaborador que não seja uma reunião presencial. Isso nem precisaria ser dito.
Ligações telefônicas, mensagens de voz, e-mails, cartas ou qualquer outro canal para dar notícia da decisão do desligamento são recursos que devem ser totalmente ignorados. Até porque há formalidades que a lei brasileira exige para a solenidade do momento, que requerem a presença do funcionário (sua assinatura, por exemplo). Mas, no que é mais importante, a dignidade da pessoa deve ser respeitada, e não há algo mais indigno do que ver rompida uma relação sem que seja mediante uma conversa olhos nos olhos.
Ademais, há sempre que se pensar na sua imagem como empresário ou gestor, e na imagem da empresa. Os funcionários remanescentes saberão do tratamento dispensado ao colega, o que tocará negativamente na relação de confiança entre vocês. Isso sem falar na possível divulgação desse ato nas redes sociais, tão comum nos dias de hoje e com o poder de arranhar a reputação de organizações de todos os portes, ás vezes de forma irreversível.
Por fim, é importante que o ato de dispensa seja noticiado ao mesmo tempo que executado, evitando-se com isso que o colaborador, se mal-intencionado, encontre subterfúgios fraudulentos para evitar sua dispensa, protelando o encontro. O melhor a fazer é guardar essa decisão consigo (ou com o mínimo de pessoas possível), sem revelá-la a ninguém até que a reunião de desligamento se conclua.
- Seja claro quanto a ser uma decisão definitiva
Não há nada mais angustiante que uma indefinição. Nada mais cruel que uma falsa esperança.
Assim, muito embora nessa hora seja um dever inegociável tratar o funcionário com cordialidade e, principalmente, com respeito, a notícia de seu desligamento deve ser franca e sem rodeios. Ao final da reunião não deve persistir o menor resquício de dúvida sobre a definitividade da sua decisão.
Por isso é importante que, antes de tomada, a decisão seja muito bem avaliada, com base em registros de performance outrora divididos com o próprio empregado e apontamentos das reuniões de feedback já feitas.
Portanto, após iniciada a reunião com respeitosa saudação, vá direto ao ponto tal como propõe a narrativa da regra de ouro número 01 acima.
- Ruptura de acesso ao ambiente de trabalho
Você está procurando ser amável, respeitoso e escolhendo bem suas palavras para não traumatizar mais ainda o colaborador desligado. Tudo isso é louvável e indispensável para executar da melhor forma possível o ato de desligamento, sempre tão tormentoso.
Entretanto, não confunda as coisas. Ainda há uma empresa para gerir, constando dentre suas responsabilidades a segurança da informação e a manutenção do bom ambiente organizacional.
Por isso, permitir que o colaborador se despeça de todos os outros colegas ao término da reunião de desligamento, por mais sedutor que possa ser, pode te trazer sérios problemas. Se planeje para que o profissional não retorne ao seu ambiente de trabalho depois de dispensado.
O ideal é que se faça acordo para que os seus pertences sejam retirados em outro dia e horário, preferencialmente fora do expediente e em local fisicamente distante do setor onde o colaborador cumpria suas funções. Se for possível, ofereça-se para entregar suas coisas a domicílio.
Caso isso se torne inviável, no mínimo se programe para que a reunião termine na hora do almoço ou após o final do expediente, mas não deixe de acompanhar o ex-funcionário na coleta de suas coisas. Não se deixe levar pelo aparente exagero que esse ato possa representar: é seu dever que nenhuma informação, documento, documento de cliente, etc., suma da empresa ou seja destruído.
Esses cuidados simples permitirão que você consiga organizar todos os documentos e informações da empresa em poder do empregado, afastando o risco de eventual ato de sabotagem, ao mesmo tempo que evitará que a comoção do momento transforme o ambiente de trabalho em algo hostil, carregado de ressentimento por conta do desligamento de um colega. De fato, quando o colaborador despedido está contrariado, muitas vezes ele transforma esse momento numa plataforma de desabafo, clamando críticas contra tudo e contra todos, exceto contra seu próprio baixo desempenho.
- Acesso aos dados eletrônicos e ao sistema: não, não e não
Se você possui um profissional de tecnologia de informação a seu serviço em sua empresa, ou um departamento de TI, ele deve estar orientado a desfazer todos os acessos do colaborador assim que a reunião de desligamento se iniciar. O ideal, a bem da verdade, é que além disso o computador do empregado seja imediatamente desligado.
Caso você não goze dessas facilidades em sua empresa, sendo você mesmo, por exemplo, quem cuida dos afazeres de TI, haja da mesma maneira. Iniciada a reunião de desligamento, se certifique que o computador do funcionário esteja desligado e inacessível e, no instante em que isso se tornar possível, desfaça todos os acessos (principalmente os remotos).
Tomada essa providência, nem pense em voltar atrás e permitir ao empregado dispensado “só gravar uns arquivos pessoais”. Não! Não devem existir arquivos pessoais. Desde sempre todos da organização devem ser conscientizados de que as informações eletrônicas são da empresa, tal como os equipamentos que as guardam e processam. Se esse pensamento estiver inserido na cultura organizacional, a gestão desse bloqueio de acesso no momento da demissão do empregado será facilitada.
Caso você entenda dispensável esse cuidado, reflita sobre o seguinte: quanto tempo você leva para selecionar milhares de pastas de trabalho importantes e deletá-las? Quanto tempo você leva para executar um programa nocivo? Quanto tempo você leva para disparar a circulação de uma informação confidencial? Quanto tempo um ex-empregado chateado e vingativo levaria também?
Pense nisso.
- Itens de propriedade da empresa
Chaves, crachá, carro, computador, manual de procedimentos, celulares e qualquer outro equipamento ou utilidade entregue ao funcionário para execução ou viabilização do seu trabalho, tudo isso deve ser devolvido no minuto final da reunião de desligamento.
Se certifique que seja possível recolher todos esses objetos ou, caso se torne inviável, colha um compromisso sério, com agendamento determinado, para que essa entrega se faça.
Não se esqueça de empregar toda a gentileza no pedido desses objetos. Lembre-se que você possivelmente estará diante de uma pessoa sem chão, de quem lhe foi tirado algo muito importante, o seu emprego. Tenha delicadeza ao fazer a solicitação de devolução, pois ao devolver os itens que há muito estavam em seu poder, o colaborador estará atribuindo uma simbologia viva à ruptura em que estará diante.
- Orientação profissional prévia
A estruturação da reunião de desligamento deve atender à todas as técnicas aqui tratadas para que seja menos desgastante possível. Entretanto, indispensável que também sejam atendidos todos os rigores da legislação trabalhista.
Assim, solenidades como o formato da carta de desligamento, onde ela deve ser assinada, os limites de quando ela pode ser apresentada, períodos de estabilidade do funcionário e um número enorme de outras questões legais devem ser rigorosamente respeitadas no ato de dispensa do empregado.
Dessa forma, antes de iniciar o processo esteja certo de ter sido bem orientado por seu departamento de pessoal, por seu advogado ou por seu escritório de contabilidade.
A assessoria prévia de um profissional nesse momento será de extrema relevância.
- Sem check list nem comece
A essa altura da leitura você deve ter notado o mar de coisas que você deve se preocupar em um ato de demissão.
Estando ciente disso, por que não lançar mão de dois check lists e não apenas um? (i) o primeiro para as ações preparatórias da reunião de desligamento; (ii) o segundo para as tarefas de execução necessária após a reunião.
Veja duas sugestões de modelo:
PREPARAÇÃO PARA A REUNIÃO DE DESLIGAMENTO | |
1 | Orientação prévia com profissional habilitado |
2 | Revisão da carta de desligamento |
3 | Lista de itens de performance que levaram ao desligamento |
4 | Lista de itens de comportamento que levaram ao desligamento |
5 | Agendamento da sala de reunião |
6 | Informação à TI para desabilitação de acessos |
7 | Lista de itens que devem ser devolvidos à empresa |
8 | Estratégia para retirada dos pertences pessoais do empregado |
9 | Colher assinatura na carta de desligamento |
10 |
TAREFAS PÓS DESLIGAMENTO | |
1 | Entregar carta de desligamento assinada ao DP |
2 | Gerir processo de realização de exame médico demissional |
3 | Organizar documentação na estação de trabalho do ex-colaborador |
4 | Redirecionar endereço de e-mail provisoriamente |
5 | Organizar arquivos eletrônicos no computador do ex-colaborador |
6 | Informar stakeholders estratégicos sobre o desligamento |
7 | Gerir processo de devolução dos itens da empresa (se for o caso) |
8 | Se certificar que as atividades sejam redirecionadas para novo profissional |
9 | |
10 |
Aproveite esse método para guardar registro desse processo, de maneira a estar bem respaldado em eventuais problemas futuros que possam advir da dispensa envolvida.
- Para casos críticos, tenha uma testemunha
Não dá para negar que vivemos um momento histórico em que as relações interpessoais exigem uma série de cuidados. Nessa esteira, convivemos com pessoas que apresentam todo tipo de comportamento, dos mais serenos aos mais desiquilibrados. Para esse último perfil, o ideal é que a reunião de desligamento ocorra na presença de uma testemunha.
Com efeito, poucas coisas envolvem tanta emoção quanto uma reunião de desligamento. Se a pessoa a ser desligada tem apresentado problemas para lidar com suas emoções, é imprudente pensar que ela agirá de forma diferente justamente numa reunião tão desgastante.
Para que aborrecimentos maiores permeiem esse ato, nada melhor que a presença de um terceiro. Além do empregado, diante de uma testemunha, ser desestimulado a grandes arroubos temperamentais, ela (testemunha) poderá contribuir com os registros dos acontecimentos vivenciados na reunião.
E a regra vale para os dois lados: se você tem um gerente na sua empresa que promoverá uma dispensa e, aos seus olhos, seu equilíbrio emocional é algo que lhe preocupa, peça para que ele seja assistido por outro profissional, preferencialmente de RH.
- E o que vem depois?
A dispensa já ocorreu, o empregado já não consta mais no quadro da empresa e todos os passos dos dois check lists que você preparou foram cumpridos.
Agora é hora de aprender com o processo. Hora de olhar para o desligamento ocorrido, como bom protagonista, e assumir humildemente que a responsabilidade foi sua.
Dessa forma, revise tudo o que aconteceu na vida profissional do colega desligado e entenda quais foram as falhas, desde a sua contratação. Reflita se ele recebeu treinamento suficiente, se teve reuniões de feedback bem estruturadas e frequentes para virar o jogo, se o perfil desenhado no processo seletivo estava adequado, se o próprio processo deixou passar alguma característica relevante do contratado, se o ambiente organizacional ao qual ele foi inserido propiciava uma boa performance, etc..
Organize todas essas percepções e aproveite-as para melhorar o processo de forma que novas contratações tenham um destino melhor, de progresso e prosperidade.
Via Fisconnect
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Fonte: jc