Neste artigo iremos abordar acerca da necessidade de cumprimento de carência para fins de concessão do benefício de pensão por morte.
O tema carência para pensão por morte é relevante principalmente diante das alterações trazidas através na lei 13.135/15, que entre outras modificações no benefício de pensão por morte, trouxe uma limitação no tempo em que os dependentes do segurado recebem a pensão.
É preciso compreender se ainda podemos afirmar categoricamente que o benefício de pensão por morte dispensa tempo de carência e principalmente quais os cuidados necessários ao se pleitear o benefício perante o INSS.
O que é carência no direito previdenciário
Antes de entrarmos na questão específica do presente artigo, é necessário analisarmos minuciosamente o que significa carência e principalmente qual a sua importância para a concessão de benefícios previdenciários.
O termo carência é muito utilizado no direito previdenciário porque ela é responsável por afastar o direito de muitos segurados que necessitam de benefícios, principalmente por incapacidade, como o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez.
Apesar da sua importância, compreender o que é carência é relativamente fácil em razão do termo estar presente em nosso cotidiano.
Cumprir carência, conforme aponta a legislação previdenciária, é ter realizado o recolhimento de um número mínimo de contribuições mensais para ter direito a um determinado benefício.
Para compreendermos melhor essa exigência de carência, vamos analisar algumas regras para a concessão de determinados benefícios.
Para a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, um dos mais importantes benefícios por incapacidade da Previdência Social, a legislação atual determina que exista uma carência mínima de 12 meses de contribuição, conforme estabelece o artigo 71 do Decreto 3.048 de 1999:
O auxílio-doença será devido ao segurado que, após cumprida, quando for o caso, a carência exigida, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos.
§ 1º Não será devido auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador de doença ou lesão invocada como causa para a concessão do benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
§ 2º Será devido auxílio-doença, independentemente de carência, aos segurados obrigatório e facultativo, quando sofrerem acidente de qualquer natureza.
Vamos analisar a carência para fins previdenciários através de um exemplo hipotético.
Imaginemos que um trabalhador tenha iniciado um vínculo empregatício em 01/03/2017, vindo a ficar doente, em razão de uma doença qualquer em 01/06/2017.
Tomamos por base que o trabalhador, devido a sua doença, não consiga trabalhar por 3 meses, período este necessário para realizar um tratamento médico ou realizar uma cirurgia.
Desprezando a regra de carência, poderíamos afirmar que nesse período, por ser segurado da previdência social, trabalhador registrado e com recolhimento previdenciário regular, o INSS deveria lhe pagar durante os 3 meses de tratamento e consequentemente de afastamento das atividades laborais, o benefício de auxílio-doença que é destinado para o segurado que está totalmente incapaz para o trabalho por um tempo determinado.
Ocorre que nesse caso, o trabalhador não iria ser contemplado com o benefício de auxílio-doença em razão de não ter cumprido o período de carência relativo à 12 contribuições previdenciárias.
A situação seria diversa se ao invés de uma doença o trabalhador tivesse sofrido um acidente de trabalho ou tivesse uma doença considerada gravíssima pela legislação previdenciária.
A Previdência Social estabelece através do artigo 30, III do Decreto 3.048/99 que o segurado não precisa cumprir a carência para a concessão do auxílio-doença se a incapacidade total e temporária tenha sido gerada em razão de acidente de qualquer natureza, inclusive acidente de trabalho ou por doença especialíssima, prevista no dados artigo 151 da lei 8.213/91 e no anexo XLV, da Instrução Normativa 77/15 do INSS, atualmente constando com as seguintes enfermidades:
- tuberculose ativa;
- hanseníase;
- alienação mental;
- neoplasia maligna;
- cegueira;
- paralisia irreversível e incapacitante;
- cardiopatia grave;
- doença de Parkinson;
- espondiloartrose anquilosante;
- nefropatia grave;
- estado avançado da doença de paget (osteíte deformante);
- síndrome da deficiência imunológica adquirida – AIDS;
- contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada hepatopatia grave.
A utilização do benefício de auxílio-doença é apenas um exemplo para ilustrar o que é carência e qual seu impacto na concessão de benefícios da previdência social.
Nesse ponto, é importante destacarmos que outros benefícios também exigem carência, como a aposentadoria por idade, por tempo de contribuição e especial, que dependem de, no mínimo, 180 contribuições.
Do mesmo modo, para as seguradas contribuintes individuais, especiais e facultativas, que estejam grávidas, só poderão receber salário maternidade quando já tiverem contribuído com, no mínimo, 10 contribuições mensais.
Outro aspecto relevante é sobre a perda de qualidade de segurado e o cumprimento da carência a partir da nova filiação a Previdência Social.
Vamos novamente compreender a questão através de um exemplo. Um trabalhador com trabalho registrado por mais de 20 anos e que venha a perder o emprego, ficando desempregado por 5 anos.
Nessa situação, quando o trabalhador se recolocar no mercado de trabalho com um novo emprego ou com as contribuições individuais, ele novamente será segurado da Previdência Social e não necessariamente terá que cumprir a carência de 12 meses para obter o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez.
Isso porque a lei 13.457/17 estipula que havendo perda da qualidade de segurado para a concessão dos benefícios de auxílio-doença aposentadoria por invalidez ou salário-maternidade, o segurado deverá contribuir com metade do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência, sendo, neste caso, 6 contribuições necessárias para o auxílio-doença e 5 contribuições para salário-maternidade.
Assim, podemos constatar que a exigência de carência é uma barreira criada e pode ser um impeditivo para que os segurados possam gozar dos benefícios previdenciários.
É preciso cumprir carência para concessão do benefício de pensão por morte?
Para respondermos acerca da necessidade de se cumprir carência para a concessão de pensão por morte aos dependentes do segurado falecido, necessário analisarmos a questão sob o enfoque da lei 8.213/91 e também da lei 13.135/15.
Objetivamente o artigo 26 da lei 8.213/91 estabelece que não existe carência para a concessão do benefício de pensão por morte, vejamos:
Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
I – pensão por morte, salário-família e auxílio-acidente
Se olharmos isoladamente para o artigo 26, poderíamos, sem qualquer dúvida, afirmar que para a concessão da pensão por morte a carência é dispensada.
Na prática, isso representaria que qualquer segurado, em caso de óbito e desde que estivesse regularmente inscrito e com contribuição previdenciária regular, poderia, em tese, legitimar os seus dependentes para serem contemplados com o benefício de pensão por morte.
Porém, a lei 13.135/15 alterou substancialmente o benefício de pensão por morte, mais especificamente em relação a um ponto crucial, o seu tempo de duração que, até 2015, era vitalício.
Atualmente a pensão por morte é cessada pela ocorrência das situações previstas no artigo 77, § 2º da lei 8.213/91, vejamos:
O direito à percepção de cada cota individual cessará:
I – pela morte do pensionista
II – para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos, ao completar vinte e um anos de idade, salvo se for inválido ou tiver deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;
III – para filho ou irmão inválido, pela cessação da invalidez;
IV – para filho ou irmão que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, pelo afastamento da deficiência, nos termos do regulamento;
V – para cônjuge ou companheiro:
a) se inválido ou com deficiência, pela cessação da invalidez ou pelo afastamento da deficiência, respeitados os períodos mínimos decorrentes da aplicação das alíneas “b” e “c;
b) em 4 (quatro) meses, se o óbito ocorrer sem que o segurado tenha vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 2 (dois) anos antes do óbito do segurado;
c) transcorridos os seguintes períodos, estabelecidos de acordo com a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, se o óbito ocorrer depois de vertidas 18 (dezoito) contribuições mensais e pelo menos 2 (dois) anos após o início do casamento ou da união estável:
1) 3 (três) anos, com menos de 21 (vinte e um) anos de idade
2) 6 (seis) anos, entre 21 (vinte e um) e 26 (vinte e seis) anos de idade;
3) 10 (dez) anos, entre 27 (vinte e sete) e 29 (vinte e nove) anos de idade;
4) 15 (quinze) anos, entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos de idade;
5) 20 (vinte) anos, entre 41 (quarenta e um) e 43 (quarenta e três) anos de idade;
6) vitalícia, com 44 (quarenta e quatro) ou mais anos de idade.
§ 2º A. Serão aplicados, conforme o caso, a regra contida na alínea “a” ou os prazos previstos na alínea “c”, ambas do inciso V do § 2º, se o óbito do segurado decorrer de acidente de qualquer natureza ou de doença profissional ou do trabalho, independentemente do recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais ou da comprovação de 2 (dois) anos de casamento ou de união estável.
Analisando a disposição legal acima transcrita, podemos verificar que apesar do artigo 26 lei da 8.213/91 permanecer inalterado no sentido de não existir carência mínima para a concessão da pensão por morte, a lei 13.135/15 trouxe uma limitação de recebimento da pensão por morte de apenas 4 meses para os dependentes cônjuges ou companheiros, quando o óbito ocorrer antes do segurado falecido ter realizado 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou união estável ter o marco inicial dois anos antes do óbito.
Assim, na prática a limitação do pagamento da pensão por morte aos dependentes do falecido por um período de apenas 4 meses, na hipótese do segurado falecido não ter 18 contribuições previdenciárias na data do óbito, funciona como uma verdadeira carência.
Atualmente para que a companheira tenha direito a pensão por morte em período superior à 4 meses é necessário que o segurado falecido tenha contribuído aos menos com 18 contribuições previdenciárias e que o casamento ou união estável tenha duração superior a dois anos.
Dessa forma, a lei 13.135/15 estabeleceu, na prática, 2 tipos de carência, a de contribuições do segurado (18 meses) e a do Casamento/União que deve ter tempo superior à 24 meses.
Como quase todas as mudanças legislativas previdenciárias, a justificativa para as drásticas alterações é evitar fraudes em casamentos ou união estável arranjados e prevenindo golpes.
Na realidade, o que temos é que essas “carências” estabelecidas pela legislação mencionada, além de não ser o meio adequado para combater fraudes, estão destruindo um pilar fundamental da Previdência Social, a cobertura social aos dependentes do segurado falecido.
Evidentemente que ao invés de aprimorar os meios de fiscalização, principalmente nos casos de casamento com menor duração, o legislador resolveu punir toda a sociedade brasileira, presumindo-se fraude e negando a cobertura social.
Vale a ponderação de que as únicas exceções para dispensar as carências de contribuições e/ou tempo de casamento é em caso de cônjuge inválido ou com deficiência e para mortes originárias de acidente de qualquer natureza ou de doença profissional ou do trabalho.
A par dessas alterações, o dependente-cônjuge ou companheira que for pleitear o benefício de pensão por morte perante o INSS deve ter extrema cautela em relação aos documentos que fazem prova do tempo da união estável ou do casamento e também referente às 18 contribuições mínimas do segurado falecido.
Na hipótese dos documentos apresentados não demonstrarem claramente o cumprimento das carências determinadas pela lei 13.135/15, o INSS, pode conceder a pensão pelo período mínimo de 4 meses, gerando, notoriamente um grave prejuízo aos dependentes.
Por essa razão, atualmente, se recomenda que o dependente do falecido organize e reúna o maior número de provas documentais possíveis antes de pleitear administrativamente o benefício de pensão por morte.
Da mesma maneira a lei 13.135/15 trouxe prejuízos aos dependentes, vez que estipulou limitação temporal da pensão por morte devida ao cônjuge ou companheiro, exceto se o dependente tiver mais de 44 anos de idade e o casamento ou a união estável tiver sido iniciado a mais de dois anos antes do óbito, conforme pode ser visto pela tabela abaixo:
Notas Conclusivas
Ao que podemos concluir, o benefício de pensão por morte tem sofrido muitas alterações, que abalaram drasticamente a sua proteção social aos dependentes do segurado falecido.
Concluímos que atualmente, apesar da existência do artigo 26 da lei 8.213/91, a lei 13.135/15 estabeleceu, na prática, 2 tipos de carências para o benefício de pensão por morte, a primeira relacionada a contribuições mínimas pela qual o segurado deve ter (18 meses) e a segunda relacionada ao Casamento/União que deve ter tempo superior a 24 meses.
As medidas trazidas pela lei. 13.135/15 retiram quase que integralmente a proteção social objeto do benefício de pensão por morte, gerando claramente, uma grave agressão a dignidade da pessoa humana, mais especificamente aos dependentes que se utilizam dos valores do benefício como forma de sobrevivência.
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Por: Gilberto Vassole
Fonte: Saber a Lei
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Fonte: Jornal Contábil
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