Perto de metade das empresas que buscaram o escritório Lacerda & Lacerda Advogados para reestruturar as suas dívidas desde o início de 2016 recorreram à recuperação extrajudicial em vez de optar pelo instrumento tradicional.
Foram 37 de 80 companhias que afirmaram estar passando por esse problema, de acordo com a banca, que assessora clientes nesse tipo de operação há 23 anos.
Segundo especialistas, o número é um sintoma de que as companhias têm visto com mais desconfiança a possibilidade de saírem em boas condições de uma recuperação judicial. De acordo com o sócio da banca Felsberg Advogados, Paulo Campana, poucas empresas entravam em recuperação extrajudicial até pouco tempo atrás, mas este ano o número aumentou consideravelmente. “É um instrumento que a lei prevê desde 2005, mas começou a ser mais utilizado agora”, diz.
Para o sócio do Lacerda & Lacerda, Nelson Lacerda, esse movimento se deu porque os empresários passaram a reconhecer os diversos “senões” da recuperação judicial. “O pior problema da recuperação judicial é a publicidade. Imagine que a empresa já está em crise e agora todos os credores, clientes e fornecedores fogem por saberem que ela está renegociando dívidas. Como ela vai voltar a funcionar depois disso?”.
Ele ressalta que é por isso que a recuperação judicial deve ser realizada no momento certo e só em alguns casos bastante específicos.
Segundo ele, outro problema é que a burocracia em um caso assim é imensa e cara, deixando a companhia paralisada pelos 60 dias previstos na Lei 11.101 para a apresentação do plano de recuperação judicial. Caso o prazo não seja atendido, a legislação prevê a transformação em falência. “Virou moda o pessoal pedir recuperação, mas a média nacional é de que menos de 1% conseguem sair desse processo”, acrescenta Lacerda, lembrando de um levantamento da consultoria Corporate Consulting e do escritório de advocacia Moraes Salles. A pesquisa mostrou que das 4 mil empresas que pediram recuperação judicial desde que a lei foi criada em 2005 substituindo o antigo dispositivo da concordata, só 45 voltaram às suas atividades, enquanto 398 faliram e a maioria dos processos continua no Judiciário.
Outro caminho
Na avaliação de Campana, a recuperação extrajudicial é um processo muito menos traumático. Ela começa com uma renegociação privada com cada um dos credores intermediada por uma banca de advocacia na qual se tenta atingir condições melhores para o pagamento da dívida. Caso um acordo seja atingido com a maioria dos credores, a companhia consegue entrar na Justiça para conseguir os mesmos termos com os outros.
Lacerda diz que isso é bom negócio principalmente para o empresário, que pode deixar a renegociação com os advogados e se preocupar com a operação da empresa.
Além disso, o sócio da Lacerda & Lacerda vê condições melhores para uma retomada quando tudo começa com uma renegociação privada. “A maior vantagem da recuperação extrajudicial é que sendo os bancos os maiores credores, apertando eles dá para reduzir a dívida em 70% facilmente. Dá para reduzir uma dívida de R$ 20 milhões para R$ 2 ou R$ 3 milhões porque muito dos juros que são cobrados pelo banco são colocados lá ilegalmente”, comenta ele.
Na mesma linha, Paulo Campana acredita que a recuperação extrajudicial seja uma solução melhor porque envolve uma renegociação privada antes de qualquer anúncio público. “A empresa se preserva mais. Se ela não conseguir fazer uma suspensão das execuções e começarem a entrar com processos de falência contra ela, aí sim ela pode fazer um pedido de recuperação judicial com o objetivo de se proteger”, explica.
Ele cita como exemplo de uma recuperação extrajudicial bem-sucedida o caso da Lupatech. Fornecedora de equipamentos e serviços principalmente para a cadeia de óleo e gás, a empresa entrou em um movimento de declínio com a crise do financeira de 2008, após a Petrobras apertar os cintos e reduzir as compras de produtos da companhia. A derrocada nos preços do petróleo depois de 2014 e o estouro da Operação Lava Jato só aumentaram os problemas.
Para fazer frente ao aumento do endividamento conjugado à redução nas receitas, a Lupatech iniciou ainda em 2014 uma recuperação extrajudicial, assessorada por Campana. Como resultado, conseguiu converter R$ 1,1 bilhão de títulos de dívida emitidos no mercado internacional em ações. “Acho que esse caso mostrou tanto a credores como a devedores as vantagens desse tipo de operação”, opina o advogado.
Para ele, é possível que o número de recuperações extrajudiciais aumente ainda mais nos próximos anos. Nos Estados Unidos, conta, esse processo já vem mostrando um aumento significativo há algumas décadas. “Acho que é uma opção importante. Os escritórios privados e o próprio governo já discutem melhoras na lei para tornar esse dispositivo ainda mais eficiente.”
Ricardo Bomfim
Fonte: DCI
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