Impactos da substituição do ADA pelo CAR para apuração do ITR.

O Imposto Territorial Rural (ITR) é um tributo de competência da União Federal, previsto no artigo 153, VI, da Constituição Federal e regulamentado pela Lei nº 9.393/96. Seu fato gerador é a propriedade, o domínio útil ou a posse (inclusive por usufruto) de imóveis situados fora da zona urbana. Mais do que uma fonte de arrecadação, o imposto também busca desestimular a manutenção de latifúndios improdutivos e incentivar o uso sustentável da terra, promovendo a função social da propriedade privada

Para ser calculada a base de cálculo do ITR, a Lei nº 9.393/96 prevê que será considerado o Valor da Terra Nua Tributável (VTNT), obtido ao multiplicar o Valor da Terra Nua (VTN) pelo quociente entre a área tributável e a área total do imóvel. A área tributável deve excluir áreas não produtivas, como preservação permanente, reservas legais (Lei nº 12.651/2012), áreas de interesse ecológico, servidões ambientais, terras impróprias para atividade rural, florestas nativas em regeneração e áreas alagadas por reservatórios de usinas hidrelétricas autorizadas.

Com o passar dos anos, foram criados instrumentos legais para que fosse possível a mensuração e comprovação da preservação ambiental e o uso adequado das terras pelo Fisco, tais como o Ato Declaratório Ambiental (ADA) e o Cadastro Ambiental Rural (CAR), instituídos pelas Leis nºs 6.938/1981 e 12.651/2012, respectivamente.

A exigência do ADA como requisito para exclusão de áreas isentas gerou intensos debates entre contribuintes e Fisco. De um lado, a Receita Federal, com base na Instrução Normativa nº 1.902/2019, sustentava que a ausência do ADA bastava para desconsiderar a isenção e autuar os que não possuíam o documento, cobrando o ITR com multa punitiva de 75%. Do outro, os contribuintes argumentavam que outras provas, como imagens de satélite e laudos técnicos, eram suficientes para comprovar a natureza das áreas. Essa rigidez na exigência do ADA resultou em um grande volume de litígios fiscais, com autuações discutidas tanto na esfera administrativa, perante o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), quanto no Judiciário.

No CARF, parte das turmas passou a aceitar outros elementos de prova, como no caso do processo nº 10730.720083/2007-41, julgado em 07/03/2023. No entanto, prevalece o entendimento majoritário de que a apresentação do ADA antes da fiscalização é obrigatória para exclusão das áreas de preservação do cálculo do ITR, conforme demonstram os recentes acórdãos dos processos nº 13984.721529/2013-17, 13984.721528/2013-64 e 10680.720606/2012-59, todos julgados em 2024.

Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou entendimento favorável aos contribuintes, decidindo que a exigência do ADA não pode ser imposta por mera instrução normativa. Esse entendimento está presente em vários precedentes, como os julgados do AgRg no REsp 1.310.972/RS, AgRg no REsp 1.429.300/SC e AgRg no REsp 1.367.968/SP. Na mesma linha, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) também firmou a Súmula nº 86 segundo a qual “é desnecessária a apresentação de Ato Declaratório Ambiental – ADA para o reconhecimento do direito à isenção do Imposto Territorial Rural – ITR”.

Para pacificar a questão, foi publicada em julho de 2024 a Lei nº 14.932/2024, que eliminou a exigência do ADA como condição obrigatória para reconhecimento da isenção do ITR. A nova legislação ampliou as possibilidades de comprovação, permitindo o uso do CAR e de outros documentos idôneos, reduzindo a burocracia para os contribuintes na Declaração do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (DITR).

Com essa mudança, surge uma nova discussão: a possibilidade de aplicação da retroatividade benéfica, prevista no artigo 106 do Código Tributário Nacional (CTN), uma vez que a ausência do ADA deixa de ser tratada como irregularidade. Dessa forma, os contribuintes que no passado foram autuados ante a falta de apresentação do ADA para a comprovação das áreas não tributáveis do imóvel rural têm um novo elemento de defesa, sendo possível a apresentação de dados já registrados no CAR como comprovação retroativa das áreas não tributáveis.

Apesar da alteração legislativa, ainda não se observa uma simplificação imediata dos documentos exigidos pelo CARF, que continua a demandar critérios rígidos para o reconhecimento das áreas isentas. Assim, é essencial acompanhar a evolução da jurisprudência administrativa para verificar como essa flexibilização será aplicada. Por outro lado, é provável que o entendimento do Judiciário, já consolidado em favor dos contribuintes, exerça influência sobre a interpretação administrativa, garantindo maior alinhamento entre as esferas administrativa e judicial.

Artigo escrito por  Isadora Nogueira Barbar Buffolo é líder da área tributária contenciosa do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados

Gabriella Calbaiser é advogada Junior da área tributária contenciosa do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados 

Laís Tuckumantel é estagiária da área tributária do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados.

por Growth Comunicações

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Fonte: PORTAL CONTNEWS
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