Por Caio Cesar Braga Ruotolo, advogado tributarista e sócio do escritório Silveira Advogados.
Nada mais propício, em tempos de reforma tributária, lembrarmos a célebre canção “Velha roupa colorida”, escrita por Belchior, que em certo trecho diz que “o passado é uma roupa que não nos serve mais”.
Tal letra, paradoxalmente, não poderia ser mais atual quando estamos falando de reforma tributária e o admirável mundo novo que será inaugurado com a instituição do IBS e da CBS.
A EC 132/23, instaurou um novo conceito de tributação do consumo no Brasil, não é perfeita, como tudo nessa vida, porém coloca o país dentre as democracias tributárias mais avançadas em termos de IVA, buscando simplicidade, segurança jurídica, não cumulatividade plena, neutralidade, incidência no destino, fim da guerra fiscal dentre outros princípios almejados pelo texto constitucional alterado.
Diante dessa nova roupagem do sistema tributário do consumo, com a instituição do IBS e da CBS, ambos ainda em discussão no Senado Federal (PLP 68/24) e na Câmara dos Deputados (PLP 108/24), não cabe mais falar na famigerada substituição tributária, muito praticada pelos Estados no âmbito do ICMS, tributo que será, finalmente, defenestrado.
A ST mais utilizada, para frente, em relação às operações subsequentes, caracteriza-se pela atribuição a determinado contribuinte (normalmente o primeiro na cadeia de comercialização, o fabricante ou importador) pelo pagamento do valor do ICMS incidente nas subsequentes operações com a mercadoria, até sua saída destinada a consumidor ou usuário final
Tal sistemática de recolhimento foi criada no âmbito do ICMS com a suposta finalidade de melhorar a fiscalização e reduzir a sonegação em relação a determinados bens produzidos e que são comercializados de forma pulverizada no varejo. Assim, passaram a tributar os fabricantes, que por serem grandes e em pouco número, seriam facilmente fiscalizados, porém, a ST se transformou num verdadeiro câncer, atingindo tudo e a todos de forma indiscriminada e causando enormes distorções e prejuízos para vários setores produtivos e para os contribuintes.
Ousamos dizer que a substituição tributária causou tantos problemas que hoje ela representa a negação do próprio instituto, pois dentre tantas distorções tem-se, aumento de pedidos de ressarcimentos de substituídos atacadistas e distribuidores, causando enormes dificuldades à própria fiscalização; perda da neutralidade na medida em que distorce preços causando até mesmo efeito inflacionário em determinados produtos, bem como induz esquemas elisivos, de modo a dificultar ainda mais a fiscalização.
Além disso, causa dispersão de substitutos e aumento da evasão fiscal em operações intermediárias; dificuldades na devolução de diferenças de bases; segregação de ICMS-ST e ICMS próprio; expansão do pagamento antecipado pela impossibilidade prática de ser firmar acordos para todos os produtos; dispersão dos sujeitos passivos para pagar ICMS-ST na entrada, embaraçando a fiscalização e a cobrança; fim da definitividade da base de cálculo da ST (julgamento do RE 593.849/MG) impondo a necessidade de fiscalizar e cobrar diversos contribuintes varejistas, em suma, tal instituto, que aparentava ser a panaceia para todos os males do ICMS, a bem da verdade, só causou e ainda causa sandices e distorções em nosso sistema tributário, não sendo um instrumento de racionalização da fiscalização nem de eficiência arrecadatória, sequer reduziu a evasão fiscal.
Some-se a isso o fato de que teremos que conviver com ela (a ST) até 2033, quando então a sistemática do IBS estará totalmente implementada.
Com a alteração constitucional trazida pela EC 132/23, delimitando que o IBS e a CBS incidirão sobre as operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, ou com serviços, bem como que a sua cobrança será no destino, a sistemática da substituição tributária, em hipótese alguma, se amolda ao desenho constitucional do novo sistema tributário do consumo, é uma técnica de antecipação de recolhimento na origem, ao passo que o IBS e a CBS serão cobrados no destino, ou seja, totalmente incompatível com a norma constitucional, caso implementada em sede de projeto de lei, seria uma verdadeira apropriação indébita pelo estado de origem.
Além disso, o simples fato de que na Constituição Federal ainda permaneça a disposição do artigo 150, §7º, que dá fundamento de validade para a substituição tributária, ao determinar que a lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, não confere ao legislador infraconstitucional a possibilidade de se criar uma esdrúxula substituição tributária do IBS e da CBS.
Some-se a isso a implementação do crédito vinculado ao pagamento, a implantação do split payment, o ressarcimento imediato ou ao menos num prazo razoável e predeterminado, a redução da complexidade operacional das informações fiscais que tornará o novo modelo mais simplificado para as empresas.
A substituição tributária é o passado, é a velha roupa que não nos serve mais, os órfãos do ICMS-ST não podem nos impor essa herança maldita, tal sistemática não se amolda ao IBS e à CBS, eis que a ST para frente tributa a produção, é cobrada na origem, enquanto as novas exações incidirão sobre o consumo e serão tributadas no destino.
Por isso, os legisladores devem olhar com olhos de ver, pois a EC 132 e o PLP 68 são “o corpo diferente” e a substituição tributária é a “velha roupa que não nos serve mais”.
por Compliance Comunicação
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Fonte: PORTAL CONTNEWS
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