Foi anunciado pelo Ministério da Economia, o início da realização de perícias telepresenciais para o dia 16.11.2020, com previsão para terminar em 31.01.2021. A medida atende a uma determinação do Tribunal de Contas da União que no final do mês de outubro deste ano, deu cinco dias para que o INSS apresentasse um protocolo para a realização das perícias à distância.
O anúncio tem causado polêmica não só no meio jurídico, como entre médicos, peritos e seus órgãos de controle e representação. Manifestaram-se contrários à esta modalidade de perícia o Conselho Federal de Medicina, a Associação Nacional dos Médicos Peritos Federais, e a Associação Nacional de Medicina do Trabalho.
Entre os principais argumentos contrários à tele perícia estariam a necessidade de exame médico presencial na pessoa do periciado, a impossibilidade de se obter a eficiência necessária à perícia, em razão da ausência de exame presencial do segurado, e, ainda, a incompatibilidade entre o papel do Médico do Trabalho e sua participação na tele perícia, como um “auxiliar” do perito.
Mas há quem defenda a tele perícia como o único meio de se conseguir diminuir a fila dos segurados do INSS que ainda aguardam perícia para receber seus benefícios previdenciários por incapacidade.
A questão é muito delicada. De um lado, milhões de segurados aguardam perícias no INSS, seja para obter benefício temporário, seja para obter benefício alegadamente permanente, seja ainda, para receber o benefício assistencial (BPC/LOAS).
Neste período de pandemia, milhões de perícias presenciais foram substituídas por perícias documentais, para adiantamento de um salário mínimo. Muitos segurados que tinham direito a benefícios superiores estão há meses aguardando a perícia presencial para receber a diferença entre o valor pago e o valor devido pelo INSS, caso seja confirmada a sua incapacidade.
E os problemas não param por aí. Temos visto em algumas cidades que não há agenda para perícia presencial, somente perícia documental. Portanto, mesmo com o retorno parcial dos peritos ao trabalho presencial em setembro, não tem sido suficiente para permitir que os segurados tenham a perícia presencial agendada e realizada.
Os segurados que conseguem passar pelas perícias presenciais, nem sempre recebem a comunicação de decisão do INSS, pois há muitos relatos de demora de muitos dias para a resposta de deferimento ou indeferimento, e até mesmo ausência do registro da realização de perícia, como se o segurado não tivesse comparecido na data agendada.
Mesmo diante desses problemas estruturais que se avolumam não só em razão da pandemia, mas também em razão da insuficiência de servidores para atender as demandas da população, o INSS tem convocado beneficiários para a revisão de seus benefícios, mesmo de benefícios que já estão sendo pagos há mais de 10 anos e que por isso só poderiam ser revistos caso o INSS apresentasse na convocação do segurado, os indícios de fraude.
Mesmo diante do caos que se instalou é preciso que você saiba se é possível ou não, no seu caso, fazer a tele perícia. Então vamos lá:
- a tele perícia só será realizada para concessão de benefício por incapacidade temporária, o antigo auxílio doença, portanto, não há perícia telepresencial para casos como incapacidade permanente, auxílio acidente, BPC/LOAS, aposentadoria da pessoa com deficiência;
- a tele perícia será realizada somente quando o trabalhador for empregado de uma empresa que possua em seus quadros ou terceirizado, médico do trabalho responsável pelo setor de segurança do trabalhador dentro da empresa;
- além da necessidade de um médico do trabalho, será necessário ainda, que a empresa tenha aderido ao programa de tele perícia. O termo de adesão para participar do programa piloto de perícias médicas por telemedicina você pode consultar aqui.
Caso você seja empregado de uma empresa que tenha aderido ao programa piloto de tele perícias, é interessante que você saiba como ela vai funcionar.
A empresa vai identificar, por meio de funcionários administrativos nomeados para tanto, os empregados que estariam solicitando benefício por incapacidade temporário cujo período de afastamento seja superior a 15 dias e que por isso, teria que passar a receber benefício por incapacidade temporária pago pelo INSS.
Identificados os trabalhadores, eles devem ser examinados pelo médico do trabalho da empresa, que precisará preencher um relatório que vai tratar dos seguintes aspectos:
- 1) histórico ocupacional do trabalhador, desde a data da sua admissão, incluindo atividades realizadas, mudanças de função, jornada, etc;
- 2) informar os riscos da atividade, do ambiente e das condições de trabalho, apontando grau de esforço, gestos e movimentos realizados para exercer suas atividades, grau de atenção necessária, existência de sobrecarga de grupos musculares;
- 3) descrever o ambiente de trabalho, inclusive equipamentos, organização, pausas, entre outros fatores relacionados;
- 4) apontar equipamentos de proteção individuais e coletivos indicados e se eles foram e são fornecidos;
- 5) se o empregado teve alteração de função ou atividade;
- 6) anamnese clínica-ocupacional;
- 7) avaliação clínica (física e mental);
- 8) conclusão pela inaptidão ou não para o trabalho.
Após o preenchimento detalhado desse requerimento, o médico do trabalho assina o documento que será encaminhado ao INSS, para agendamento da perícia tele presencial, momento em que o perito poderá acatar ou não a conclusão do médico do trabalho e poderá.
O Médico do Trabalho, portanto, de médico responsável pela saúde do trabalhador na empresa, passará a ser um “assistente do perito federal”. Há um desvio de função desse importante profissional, e essa é a principal queixa da associação nacional que os representa.
Resta saber se o relatório preenchido pelo Médico do Trabalho e encaminhado ao INSS será franqueado ao trabalhador, e se ele deverá assinar ou não a documentação em conjunto com o Médico do Trabalho.
Entre as vantagens de tudo que foi apresentado aqui, é possível a gente indicar a provável diminuição da fila, e até mesmo, uma análise mais detalhada e mais clara, do problema de saúde do segurado e a sua extensão, do que costuma acontecer nas perícias federais realizadas em períodos de normalidade.
Em contrapartida, é preciso dizer que esta será uma solução que não atingirá a grande maioria dos segurados, pois não passarão por tele perícia os segurados cujos empregadores não possuírem e não disponibilizarem um médico do trabalho para tanto. Nesse caso, o custo do trabalho adicional do Médico do Trabalho será da empresa, e não do governo federal.
Não é difícil perceber que filtradas as grandes empresas que possuam e disponibilizem médicos do trabalho para tanto, e que ainda queiram participar do programa, poucos serão os segurados que terão suas tele perícias realizadas.
Empregados de pequenas empresas e contribuintes facultativos ou individuais não sairão da fila tão cedo, pois não poderão participar deste programa.
Há ainda a desvantagem de que o perito, que será quem vai concluir ou não pela incapacidade do trabalhador, não poderá examinar pessoalmente os segurados, tampouco poderá fazer as manobras necessárias para a avaliação.
Fora isso, pode-se apontar como desvantagem, o fato de haver um risco real de acesso ao ato pericial gravado, por terceiros estranhos. Afinal, em um país em que o sistema de um dos tribunais superiores (STJ) foi recentemente invadido por hackers, que sequestraram dados, documentos e informações, não dá para confiar que isso não venha a acontecer com as tele perícias, expondo pessoas a um dano inimaginável.
O que nos resta é aguardar que somente as vantagens aqui levantadas se confirmem, e que as desvantagens sejam todas fruto de mera especulação ou pessimismo.
Por: Priscila Arraes Reino, advogada especialista em direito previdenciário e direito do trabalho, coordenadora adjunta do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário por MS, vice presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de MS, primeira secretária da Comissão da Advocacia Trabalhista da OAB/MS, e palestrante.
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Original de Campo Grande News
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Fonte: Jornal Contábil
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