Muito se ouve falar sobre as formas de fim de vínculo empregatício, seja por iniciativa do empregado, do empregador, ou ainda, por um acordo entre ambos. Ocorre que é possível que essa ruptura de vínculo se dê de forma amistosa e outras vezes de forma conturbada, quando não há concordância entre as partes.
O tema do presente artigo trata de uma forma de ruptura que se revela injusta. Fala-se da dispensa discriminatória, a qual muitas vezes, infelizmente, está presente no fim do vínculo empregatício, mostrando-se válido o seu conhecimento para que seja possível identificar no cenário que lhe for apresentado ou vivenciado.
O que você verá nesse artigo:
- Dispensa Discriminatória
- Meios de prova
- O que entende o Judiciário?
- Direitos
- Considerações finais
Leia também: Justiça Condena Bradesco Em R$ 800 Milhões Por Dispensa Discriminatória
Dispensa Discriminatória
A dispensa discriminatória em muito tem a ver com um ambiente de trabalho que deixa de ser saudável passando a ser hostil, de forma a interferir na qualidade do dia a dia do funcionário no local de trabalho e de igual forma interferindo na sua saúde emocional.
A Constituição Federal se preocupou em resguardar os direitos dos trabalhadores, sendo que de cara em seu artigo 7º, inciso I, refere o direito à relação de emprego protegida contra a dispensa sem justa causa ou arbitrária, prevendo indenização.
E aqui ao tratar da dispensa arbitraria entra a questão da dispensa discriminatória, inclusive com vedação dada pela Lei 9.029/95.
Fato é que a partir de aspectos que na realidade não tem relação com a qualidade do trabalho e o trabalho em si, ocorre a dispensa do trabalhador. Esse cenário apresenta-se como inconsistente uma vez que a dispensa em nada se fundamenta no trabalho.
De forma a exemplificar um motivo ensejador de dispensa que se caracteriza como discriminatória tem-se a etnia, religião, orientação sexual e problema de saúde. Ou seja, em razão de estigmas ou preconceitos.
Desse modo, a dispensa discriminatória se caracteriza por ser uma demissão sem justa causa, porém que implicitamente verifica-se estigmas ou preconceitos sem relação com o desempenho profissional. Logicamente tal fato se mostra irrazoável.
Por conta disso no momento de uma dispensa sem justa causa – lembrando que as dispensas por justa causa, devem ser fundamentadas em uma das hipóteses previstas no artigo 482 da CLT – é preciso observar o que poderia ter dado causa em relação ao trabalho ou às condições da empresa.
Caso a dispensa se mostre como relacionada a aspectos pessoais, a dispensa discriminatória resta configurada podendo então ser revertida. Porém, para isso é preciso comprovar o ato discriminatório.
Leia também: Saiba Como Identificar Uma Dispensa Discriminatória
Meios de prova
Ao falar em meios de prova é preciso citar o artigo 818 da CLT:
Art. 818. O ônus da prova incumbe:
I - ao reclamante, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao reclamado, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do reclamante
Ou seja, a legislação apresentou a regra geral em que o requerente deve constituir a prova para corroborar o que foi alegado. Todavia, há exceções, sendo que a Justiça do Trabalho pode tornar mais fácil a vida daquele que alega, mas está com dificuldades de produzir prova.
É possível que haja a chamada “inversão do ônus da prova”, quando está presente a) dificuldade ou impossibilidade de provar as alegações; b) fácil acesso da reclamada em apresentar as provas; c) determinados casos previstos na legislação.
Alguns exemplos de meios de prova seriam: testemunhas, mensagens de texto, áudios, documentos, atestados para afastamento, dentre outros meios.
De forma específica, em se tratando de portador de vírus ou doença, tem-se a Súmula 443 do TST, que assim dispõe: “Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.”
De modo que, há a presunção de dispensa discriminatória. Nesse caso, alguns pontos devem ser analisados. Primeiramente, uma observação, para que seja aplicada tal Súmula, é preciso que o empregador tenha conhecimento da doença que acomete o funcionário.
Outra questão que se mostra necessário comentar é que se o empregado praticar alguma hipótese de dispensa por justa causa, há o afastamento da referida Súmula.
O grande problema dessa Súmula é que ela resolveu em parte o problema referente à dispensa discriminatória. Houve então a previsão de nesta forma de dispensa por conta de doença ser procedida a reintegração do trabalhador, porém, ao referir doença grave passa a se tornar uma orientação muito genérica.
Ademais, não há qualquer informação referente ao período em que a empresa teria que obrigatoriamente manter o trabalhador no seu quadro de funcionários em vista de que a dispensa poderia se configurar como discriminatória.
Em decorrência disso, ao gerar diversas possibilidades a depender do entendimento e interpretação, inúmeros casos chegam para apreciação do Judiciário.
Leia também: Veja Como Funciona O Aviso Prévio
O que entende o Judiciário?
Casos considerados obviamente reprováveis de demissão sem justa causa, todavia com evidente relação com aspectos pessoais do funcionário, chegam ao Judiciário para que se tenha uma orientação a ser seguida. Além disso, tais decisões buscam ter como base e modelo das consequências daqueles que procedem com uma dispensa discriminatória.
Foi o que aconteceu em um caso que chegou ao Tribunal Superior do Trabalho para análise. No caso houve a constatação de dispensa discriminatória duas vezes.
A reclamante era portadora de câncer de mama, sendo que no ano de 2015 foi dispensada quando já tinha o diagnóstico, assim diante de uma ação judicial teve sucesso em sua reintegração.
Ocorre que quando estava em tratamento para prevenção da recidiva da doença, no ano de 2018 foi novamente dispensada, momento em que recorreu ao Judiciário para solicitar a declaração de dispensa discriminatória, bem como a sua reintegração.
Esse segundo processo chegou ao TST, uma vez que na ação trabalhista argumentou a empresa empregadora que a dispensa se deu por desempenho insuficiente por parte da reclamante.
O Tribunal Regional deferiu a reintegração, porém, de forma diversa a Oitava Turma do TST, acolheu o recurso da Reclamada, concluindo que a dispensa se deu de forma válida em razão do baixo desempenho apurado em procedimento interno.
Ocorre que na sequência por meio de embargos a SDI-1 (Sessão de Dissídios Individuais), a reclamante sustentou que por conta do câncer possuía também distúrbio de ansiedade e estava submetida a terapia hormonal. Argumentou que a dispensa era considerada discriminatória uma vez que só teve uma avaliação ruim sendo que nas demais foi bem avaliada. Todavia, ao se referir ao desempenho, mencionou que seu quadro clínico no período sim interferia no seu desempenho, entretanto não se mostrava razoável a dispensa por conta disso.
O relator então fez suas ponderações iniciando pelo fato da presunção prevista na Súmula 443 a qual não foi afastada por qualquer prova por parte do empregador. Ademais, afirmou que a dispensa se fundamentou em uma única avaliação, a qual foi averiguada em período de tratamento, que conforme destacou o ministro, revela-se como uma situação de vida em que são esperadas variações de desempenho, tendo em vista a sua saúde fragilizada.
Portanto, por maioria foi declarada a dispensa discriminatória no caso, momento em que restou determinada a reintegração da reclamante, reafirmando a Súmula ao entender que não havia prova que demonstrasse o contrário do que fora afirmado, resultando na configuração do ato discriminatório.
Referente ao caso de problema de saúde, é importante observar que são muitas as empresas em que há previsão no contrato de trabalho de plano de saúde. Imagine na situação citada acima que ao ser dispensado de forma discriminatória, houve o corte do benefício de plano de saúde de modo a deixar o funcionário mais abalado ainda, o que fere inclusive a dignidade da pessoa humana.
Portanto, alinhada a decisão com a legislação constitucional e infraconstitucional, de modo a preservar o direito do trabalhador na relação de emprego, sem que em razão de um problema grave de saúde sofra consequências discriminatórias.
Direitos
Como visto, em caso de constatação de dispensa discriminatória, recomenda-se ingressar em Juízo para que seja reconhecida tal dispensa e sejam então garantidos os direitos previstos na legislação.
Um efeito evidente nestes casos é o fato do abalo emocional que suporta o empregado dispensado nessas condições. Isso demonstra o total descaso do empregador frente a saúde e bem-estar dos seus colaboradores, uma vez que em caso de dispensa discriminatória que se tornou conhecida pelos colegas, estes acabam percebendo este descaso por parte do empregador.
Na esfera jurídica os direitos possuem base na Constituição Federal, bem como na Lei 9.029/95. A referida lei em seu artigo 4º prevê as medidas a serem imediatamente tomadas, podendo o empregado optar entre:
- A reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais;
- A percepção, em dobro, da remuneração no período de afastamentos, também corrigidas e com juros;
Além disso, cabe a reparação por danos morais diante de todo o constrangimento e prejuízos suportados pelo empregado.
Considerações finais
O direito constitucional de proteção ao trabalhador no que diz respeito à dispensa arbitrária, busca resguardar uma relação de emprego justa e saudável. A dispensa discriminatória viola tal dispositivo, bem como viola o disposto na Lei 9.029/95.
Essa forma de dispensa não se refere ao trabalho em si desempenhado pelo funcionário, mas sim por aspectos da sua vida pessoal que são levados em conta pelo empregador para de forma implícita fundamentar a dispensa, que na realidade trata-se de uma dispensa discriminatória, seja por questões de saúde, etnia, orientação sexual ou religião.
De forma a ilustrar esse ato, foi analisado um processo que chegou ao TST em que a reclamante era portadora de câncer de mama sendo que havia sido dispensada sob fundamento de desempenho insuficiente, enquanto estava em tratamento, fato este de conhecimento da reclamada.
Para o Tribunal restou demonstrado que considerando a presunção de dispensa discriminatória em caso de doença grave, não houve por parte da empresa comprovação do contrário, bem como há uma variação de desempenho até mesmo justificável pelo quadro clínico da reclamante, não se mostrando suficiente para uma dispensa regular.
Desse modo, a dispensa discriminatória merece atenção, pois viola a legislação bem como no caso em questão confronta direitos fundamentais como a vida e a dignidade da pessoa humana.
Por Welington Augusto.
Original de Saber a Lei
Fonte: Jornal Contábil
Abertura de empresa em São Bernardo do Campo com o escritório de contabilidade em São Bernardo Dinelly. Clique aqui