Juristas e entidades de defesa dos direitos trabalhistas manifestaram forte crítica à decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a suspensão em âmbito nacional de todos os processos trabalhistas que discutem o reconhecimento de vínculo empregatício em contratos firmados por pessoa jurídica (PJ).
Magistrados e advogados ouvidos pelo Brasil de Fato consideram a medida uma grave ameaça aos direitos sociais previstos na Constituição, um favorecimento à elite econômica e um risco para a sustentabilidade da Previdência Social.
Paralisação de Ações sobre a Legalidade da “Pejotização”
A decisão de Gilmar Mendes ocorreu no contexto do tema 1389 da repercussão geral, que versa sobre a legalidade da contratação de trabalhadores como PJ ou autônomos. A partir dessa decisão monocrática, todas as ações em andamento na Justiça do Trabalho que abordam essa questão ficam paralisadas até que o plenário do STF profira um julgamento definitivo sobre o tema.
Impacto em Milhares de Processos sobre a “Pejotização”
A suspensão imposta pelo STF afeta um grande número de processos judiciais que debatem a prática conhecida como “pejotização”. Essa prática consiste na contratação de trabalhadores por empresas como se fossem prestadores de serviço (pessoas jurídicas), mesmo que esses trabalhadores desempenhem atividades e cumpram obrigações típicas de um empregado com vínculo formal.
Grave Ameaça aos Direitos Sociais Constitucionais
Luiz Eduardo Fontenele, juiz do trabalho do Tribunal Regional do Trabalho do Espírito Santo (TRT-ES), avalia que a decisão de Gilmar Mendes representa uma séria ameaça aos direitos sociais assegurados pela Constituição Federal. “Se o julgamento seguir a linha da decisão monocrática do ministro Gilmar, os efeitos podem ser extremamente deletérios, devastadores”, adverte o magistrado.
Questionamento do Papel da Justiça do Trabalho e Risco ao Artigo 7º da Constituição
Para o juiz Fontenele, a decisão do STF, ao questionar o papel da Justiça do Trabalho e defender a expansão irrestrita da “pejotização”, confronta diretamente o artigo 7º da Constituição, que garante um amplo conjunto de direitos aos trabalhadores brasileiros.
Desmonte de Condições Mínimas de Trabalho
“Com isso, caminhamos para um desmonte das condições mínimas e civilizatórias de trabalho: salário mínimo, horas extras, descanso remunerado, férias com adicional, licença-maternidade, auxílio-doença, fiscalização do trabalho análogo à escravidão, tudo isso fica comprometido. Vai passar a valer tudo”, critica Fontenele.
Risco Institucional e Esvaziamento da Justiça do Trabalho
O magistrado também alerta para o risco institucional da decisão: “A decisão trata a Justiça do Trabalho como se fosse uma instituição rebelde, o que é inaceitável. Desde a Constituição de 1946 e, mais ainda, após a Emenda Constitucional 45 de 2004, é papel da Justiça do Trabalho julgar fraudes nas relações de trabalho. […] O questionamento da competência da Justiça do Trabalho por meio do tema 1389 vai na contramão desse reconhecimento.”
Transferência de Competência e Sobrecarga da Justiça Comum
Fontenele expressa preocupação com um possível movimento de esvaziamento do papel da Justiça do Trabalho e de relativização dos direitos constitucionais. “Se a competência para julgar esses casos for transferida para a justiça comum, teremos o pior dos mundos: a Justiça do Trabalho, que é capilarizada, estruturada, com 24 Tribunais Regionais em todo o país, vai ficar esvaziada, praticamente sem função. E, ao mesmo tempo, a justiça comum, que já está sobrecarregada, terá que absorver mais essa demanda.”
Leia Também:
- Mais Gestão, Menos Intuição: O Papel da Contabilidade nas Pequenas Empresas
- Publicada versão 11.1.1 do programa da ECF
- Imposto de Renda: nova tabela progressiva mensal a partir de maio
- Ação de Gilmar deve afetar esses 16 milhões de MEIs
- Reforma Tributária: Empresas Testarão Novo Sistema em 2026 com Portal Unificado e CNPJ Alfanumérico
Impacto na Sustentabilidade da Previdência Social
Marcus Menezes Barberino, juiz do trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas e interior de SP), adverte que a medida do STF pode comprometer a sustentabilidade da Previdência Social brasileira. Segundo ele, ao incentivar a “pejotização”, a decisão enfraquece a principal fonte de financiamento da seguridade social, pois a ausência de reconhecimento de vínculo empregatício implica na falta de recolhimento de contribuições.
Distorção do Papel do STF e Violação da CLT
Para Barberino, a lógica adotada por Gilmar Mendes desvirtua o papel do Supremo e contraria o artigo 9º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que considera nulo qualquer ato que vise fraudar os direitos do trabalhador.
Legalização da Fraude e Impacto no Pacto Social
“Se prevalecer o que o ministro aponta como sendo sua percepção do problema, basta que as pessoas contratem qualquer forma de prestação de trabalho, vinculada a alguma pessoa jurídica (e o Brasil tem várias dessas formulações), e isso estaria, em princípio, imune à declaração de fraude”, explica Barberino.
Ele enfatiza o potencial impacto dessa decisão no pacto social brasileiro, cuja principal política de bem-estar é a Previdência Social.
Proteção aos Interesses Empresariais em Detrimento dos Trabalhadores
José Portella, integrante do coletivo Advogados pela Democracia, considera a medida mais um passo do STF na direção de proteger os interesses da classe empresarial em detrimento das garantias mínimas dos trabalhadores. “Essa decisão é extremamente preocupante. O STF vem se colocando como uma instância revisora da Justiça do Trabalho, só que pró-poder econômico”, afirma.
Reversão Sistemática de Decisões da Justiça do Trabalho
Segundo Portella, o STF tem sistematicamente revertido decisões da Justiça do Trabalho que reconhecem vínculo empregatício em casos de “pejotização”. Ele ilustra essa situação com o caso de uma professora que teve seu vínculo empregatício reconhecido na Justiça do Trabalho, mas a decisão foi revertida no STF sob relatoria de Gilmar Mendes.
Institucionalização do Esvaziamento da Proteção ao Trabalho
O advogado alerta que a definição de uma jurisprudência nesse sentido pode institucionalizar o esvaziamento da proteção ao trabalho, consolidando um novo modelo de relações trabalhistas com menos direitos para o trabalhador.
Conflito de Interesses no Judiciário
Portella critica o fato de Gilmar Mendes ser sócio de uma instituição de ensino superior, questionando como ele pode julgar casos envolvendo professores contratados de forma precária no mesmo setor. “Isso escancara um conflito de interesses gravíssimo”, critica.
Ele aponta para a proximidade de ministros do STF com o grande empresariado e como isso pode influenciar em seus julgamentos.
“Pejotização” como Legalização da Fraude
Gustavo Ramos, advogado com atuação no STF e mestre em Direito do Trabalho, classifica a “pejotização” como uma forma de legalizar fraudes sob o pretexto de modernidade.
Desorganização do Mundo do Trabalho e Ruptura do Pacto Social
“A pejotização desorganiza o mundo do trabalho, quebra a Previdência e implode o pacto social previsto na Constituição”, afirma Ramos, membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD). Ele ressalta que afastar a Justiça do Trabalho da análise desses casos viola o pacto constitucional de 1988 e enfraquece a proteção social dos trabalhadores.
Crescente Esvaziamento da Justiça do Trabalho
Outros especialistas, como a desembargadora aposentada Magda Biavaschi e o sindicalista Valeir Ertle, também se manifestaram contra a decisão, destacando o crescente esvaziamento da Justiça do Trabalho por decisões do STF que anulam vínculos empregatícios reconhecidos pelo TST, favorecendo a terceirização e a pejotização.
“Devastação Laboral” Promovida pelo STF
Grijalbo Coutinho, juiz do TRT, também critica o avanço da pejotização e a flexibilização de direitos trabalhistas, alertando que o STF está promovendo uma “devastação laboral”.
Resumo das Críticas à Decisão do STF
Crítica | Impacto Potencial |
---|---|
Enfraquecimento da Justiça do Trabalho | Esvaziamento da competência e sobrecarga da Justiça Comum |
Ameaça aos direitos sociais constitucionais | Perda de direitos como salário mínimo, férias, licença-maternidade, etc. |
Favorecimento da elite econômica | Ampliação da exploração do trabalho e aumento da desigualdade |
Risco à sustentabilidade da Previdência | Redução da arrecadação e potencial colapso do sistema previdenciário |
Legalização da fraude (“pejotização”) | Desvirtuação das relações de trabalho e precarização dos contratos |
Violação da CLT | Desrespeito ao princípio da nulidade de atos que visam fraudar direitos trabalhistas |
Conflito de interesses no Judiciário | Questionamento da imparcialidade de ministros em casos específicos |
Desorganização do mundo do trabalho | Instabilidade nas relações laborais e insegurança jurídica |
Ruptura do pacto social | Desconfiança nas instituições e enfraquecimento da proteção social |
Risco ao Fim dos Direitos Trabalhistas
Jorge Souto Maior, jurista da Universidade de São Paulo (USP), alertou para o risco de a decisão representar o fim dos direitos trabalhistas, descrevendo a “pejotização” como uma fraude que ameaça extinguir a proteção da CLT. Ele defende a urgência da organização da classe trabalhadora para preservar os princípios constitucionais.
O post Decisão do STF Suspende Processos sobre “Pejotização” e Gera Críticas de Juristas e Magistrados apareceu primeiro em Jornal Contábil – Independência e compromisso.
Contabilidade em SBC é com a Dinelly. Fonte da matéria: Jornal Contábil